Nesta quarta-feira (21), entidades empresariais voltarão a pressionar o governo do Estado pela revogação do corte de incentivos fiscais, promovidos pelo Piratini. Liderada pela Federação das Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), as organizações, incluindo federações e associações comerciais, se reunirão a partir das 14h30min para tratar do tema em Porto Alegre. Para a reunião, foram convidados deputados estaduais e os titulares de quatro secretarias, Fazenda, Agricultura, Desenvolvimento Econômico e Casa Civil.
Vinte e quatro horas antes da reunião, até a tarde desta terça-feira (20), o presidente da Federasul, Rodrigo Sousa Costa, dizia não ter recebido confirmação de nenhum dos secretários.
- Até quando fomos ameaçados, fomos (até o governo) e sentamos para negociar. O governo tem de mostrar disposição para o diálogo - disse ele.
Em entrevista à coluna, o dirigente explicou a estratégia das entidades empresariais para retomar as conversas com deputados e Piratini. A seguir, os principais trechos.
Como o setor empresarial irá se posicionar na reunião desta quarta-feira (21)?
O principal é nossa disposição para o diálogo. Quando o governo traz uma versão, ou narrativa, ou mesmo quando fala tecnicamente, "benefícios fiscais setoriais", ele traz a impressão de que existe uma caixa-preta, que o governo mexe em privilégios. Por isso, essa opção por um diálogo aberto frente aos meios de comunicação, com a presença do parlamento, e convidando quatro secretários. Não há nada a esconder, estamos em busca de transparência total. Não entendemos que os quatro decretos sejam sobre benefícios fiscais. Entendemos que são equiparações competitivas. São uma forma de trazer alimentos a preços mais acessíveis para a família gaúcha. Quando você tira o arroz, o feijão e a carne da cesta básica, sobre a qual incidia 7%, esses produtos são tirados da cesta básica e passa a incidir sobre eles 17% por dentro. Isso retira renda da população. É menos dinheiro circulando. É dinheiro que vai para o Estado, que sai das mãos do trabalhador, da dona de casa, da secretária, da comerciária. É menos dinheiro circulando no comércio. Esse é o primeiro efeito deletério que percebemos nos decretos. O segundo: quando o governo passa o ICMS da carne suína, das aves, dos óleos de 7% para 12%, está mexendo com a pequena agricultura familiar: aqueles pequenos agricultores que subsistem agregando valor, através de um aviário, mas que precisam vender (seu produto) para uma cooperativa, para uma empresa que tem de ser viável. Se esse setor já estava na linha vermelha com ICMS de 7%, quando você passa para 12%, ele perde completamente a capacidade de competir com a proteína animal produzida em Santa Catarina ou no Paraná. Isso provocaria a curto prazo o fechamento dos aviários.
Não entendemos que os quatro decretos sejam sobre benefícios fiscais. Entendemos que são equiparações competitivas.
Vocês acreditam que, do final do ano passado até agora, conseguiram esclarecer esse ponto de vista perante a população?
Começamos a despertar a opinião pública. Quando você lê os decretos, é difícil entender o que afetam. A simples leitura não faz com que tenhamos compreensão total, de arroz, feijão, batata, as frutas saem da cesta básica gaúcha. Isso faz com que muitas pessoas comprem essa narrativa de que seria uma retirada de benefícios fiscais de 64 setores. Revogar isenção do pão francês, que estava com zero passa para 17%? Não sei qual narrativa que o governo vai incorporar amanhã, se vierem representantes. Até o momento, não tive confirmação (de presença). Mandamos, na quarta-feira da semana passada, convites para quatro secretários, como demonstração de abertura ao diálogo. É impossível que, em uma secretaria, não haja pessoas que representem o governo. Até o momento, não tive a confirmação de nenhum dos secretários.
Como será, caso o governo não compareça?
Gostaria que o governo estivesse presente, porque nossa disposição é para o diálogo aberto. Mas tenho dúvidas sobre qual será a estratégia do governo. Sempre que fomos convidados, fui ou mandei representantes. Se a disposição do governo é por diálogo, então que seja por transparência total, na frente dos meios de comunicação e do parlamento gaúcho. Até 19 de dezembro, ele (o governo) poderia dizer que não estava ameaçando ninguém. Mas, quando disse: "Se vocês não aceitarem o aumento do ICMS, vou fazer os decretos", nas entrelinhas, estava dizendo: "Vocês serão extintos". Isso é uma forma de coagir. Não é disposição para o diálogo.
Em todas as declarações, o governador Eduardo Leite tem deixado claro de que não irá recuar dos decretos. Vocês ainda acreditam que é possível revertê-los pelo diálogo?
Ele disse, no ano passado, que colocaria de qualquer forma o projeto de aumento do ICMS para 19,5%. Que o parlamento decidisse. No momento em que não tinha apoio, retirou (o projeto). Disse também que não aumentaria impostos. Todos nós somos suscetíveis à mobilização da opinião pública. Até o dia 15 de novembro, nós, a sociedade civil organizada, estávamos de braços dados com o governo e o parlamento, discutindo o futuro do Estado para 2035. Estávamos pensando nas centenas de bilhões de reais que poderiam ser acolhidos ou não, no quanto isso movimentaria o parque metal-mecânico de diversas cidades, nas possibilidades do turismo, em como a gente amplia a arrecadação através do aumento da geração de riqueza. Era essa discussão, o caminho que estava apontado pelo governador. No dia 16 de novembro, eu estava com uma palestra marcada junto com o governo em Santa Rosa. A palestra do governador era "Rio Grande do Sul - Uma janela de oportunidades". Esse era o Norte apontado pelo governo. De repente, ele nos surpreendeu apontando 180 graus para o outro lado. "Vou apontar agora para a tentativa de aumento de impostos, porque outros Estados estão fazendo isso". Foi uma guinada. Queremos retroagir ao momento em que toda a sociedade gaúcha, depois de todas as reformas e sacrifícios para chegarmos ao equilíbrio fiscal, em que estávamos de braços dados: sociedade civil, governo e parlamento. A guinada quem deu foi o governo. Não foi de nossa parte. De nossa parte, continuamos acreditando inclusive nas promessas de campanha de que é possível, através da gestão e sem aumento de impostos, ampliar arrecadação.
Qual é o maior entrave para uma negociação em bloco com o governo? Há divergência entre os setores?
A negociação individual é normal. É natural que o governo faça isso. Acho que o Estado pagou preço alto demais por negociações, quando o governo conseguiu dividir a sociedade civil organizada. Não acho que isso esteja acontecendo hoje. O que não acho razoável é que no governo, quatro secretários sejam convidados para um debate e não mandem representantes. Sempre que um setor ou todos forem convidados, têm de ir. A negociação individual é normal. Mas é importante que o governo saiba que, atrás de determinado setor, há um bloco de toda a socidade civil organizada para que não aconteça negociações como a que houve em dezembro, em que um setor, entre a extinção e o prejuízo, cedia por medo de ver seus associados extintos. As pessoas não podem, por terem sido divididas, estarem tão frágeis, que se sintam coagidas a aceitar qualquer situação. Não me incomoda que o governo sente à mesa individualmente com os setores, desde que os setores saibam que têm respaldo de muitas outras federações e entidades, desde que os setores negociem em prol do interesse público sem se sentirem coagidos. O problema da negociação do ano passado foi a forma como foi conduzida. Pegou a todos de surpresa, com uma situação muito grave e através de uma negociação pesada demais, de coação: "Vou botar os decretos aqui, se não aceitarem é assim ou assim, e deu". Foi meio patrola. A democracia gaúcha reagiu de forma saudável. O parlamento não se intimidou, a base do governo foi muito firme, tive orgulho de posicionamentos de deputados da base, que disseram: "Olha, votei com o governo até aqui, mas dessa forma não aceito". Acredito que isso pode acontecer agora.
Vocês pretendem elevar o tom?
Estamos abrindo o diálogo com toda a disposição: queremos conversar com governo e parlamento, queremos encontrar soluções. Há vários projetos que podem aumentar arrecadação. Todos os setores podem contribuir. É do interesse de todo o Estado manter contas públicas equilibradas. Mas o governo tem de sentar à mesa. Do mesmo jeito que fomos. Até quando fomos ameaçados, fomos e sentamos para negociar. O governo tem de mostrar disposição para o diálogo.
Como o senhor avalia a sugestão do presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo, de deixar de pagar o ICMS em abril como forma de protesto?
No calor do momento, uma entidade levantou essa hipótese. Não foi definido como estratégia. E nós, da Federasul, não apoiaríamos essa estratégia. Não começaríamos assim. Não se pode abrir o diálogo da mesma forma como o governo começou: com ameaça. E não é da índole do empresário parar de pagar imposto.
Que propostas vocês vão apresentar como alternativas possíveis para aumento de arrecadação?
Uma das propostas que a gente está levantando é a renegociação de dívidas judicializadas. A exemplo do que São Paulo fez. Tem potencial de arrecadar R$ 10 bilhões.
O senhor chegou a citar a possibilidade de aumento de arrecadação por meio de reforço na formalização de negócios informais.
Levantaram várias hipóteses. Tem o setor das apostas eletrônicas, que pede para ser regulamentado e taxado. Acredita-se que isso possa gerar uma arrecadação em cinco anos de mais de R$ 4 bilhões. Minas Gerais arrecadou R$ 5 bilhões com isso. Citei a informalidade: no mercado de cigarros no Brasil, hoje, 43% é de contrabando. No RS, é 32%. Qual a perda de arrecadação disso? Quem está comandando a venda de cigarro ilegal, em boa parte do país, é o crime organizado. Tem uma série de políticas que poderiam ser enfrentadas.