O que "os nazistas fizeram com os judeus", expressão utilizada pelo presidente Lula na infame declaração em Adis Abeba, tem nome: Holocausto.
Trata-se de uma das maiores barbáries que a humanidade já cometeu, o assassinato sistemático de 6 milhões de pessoas, a maioria judeus, mas também todos aqueles que Adolf Hitler e sua máquina de morte consideravam que não deveriam existir - negros, homossexuais, ciganos, pessoas com deficiência, "comunistas", eslavos.
A palavra genocídio não existia à época. Como nominar o inominável? Coube a Raphael Lemkin, um advogado judeu polonês, tentar encontrar os termos para descrever o horror.
Essa história está no Museu do Holocausto: Lemkin criou a palavra "genocídio" combinando o prefixo grego "geno", que significa raça ou tribo, com a palavra latina "cídio", que quer dizer matar. Com este termo, ele definiu o genocídio como "um plano coordenado, com ações de vários tipos, que objetiva à destruição dos alicerces fundamentais da vida de grupos nacionais com o objetivo de aniquilá-los".Em seu livro “Axis Rule in Occupied Europe” (“Domínio do Eixo na Europa ocupada”), de 1944, vai além: não era apenas extermínio de pessoas, é a eliminação de uma cultura e tradição.
A palavra foi então aplicada da seguinte maneira: “Por genocídio entende-se quaisquer dos atos abaixo relacionados, cometidos com a intenção de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial, ou religioso, tais como: (a) Assassinato de membros do grupo; (b) Causar danos à integridade física ou mental de membros do grupo; (c) Impor deliberadamente ao grupo condições de vida que possam causar sua destruição física total ou parcial; (d) Impor medidas que impeçam a reprodução física dos membros do grupo; (e) Transferir à força crianças de um grupo para outro”.
O genocídio armênio é considerado como o primeiro ato de extermínio sistemático de um grupo étnico da história recente. Durante a Primeira Guerra Mundial, o então Império Turco-Otomano assassinou em massa a população da Armênia, vitimando 1,8 milhão de pessoas. Depois, veio o Holodomor, o genocídio ucraniano, que ocorreu entre 1932 e 1933. As ações que levaram à morte de 3 milhões a 3,5 milhões de pessoas por inanição foram obra do governo soviético de Josef Stalin . Na sequência, o Holocausto. Mais recentemente, Ruanda, com massacre em massa de pessoas do grupo étnico tutsi (e hutus moderados) pelos hutus, entre 7 de abril e 15 de julho de 1994, durante a guerra civil no país.
Lula erra ao relacionar as ações israelenses em Gaza com o Holocausto ou genocídio por várias razões. Primeiro porque relativiza o termo: a morte das vítimas do nazismo é o horror em seu estado mais bruto. Por mais que o governo israelense e suas forças estejam cometendo erros em Gaza, por vezes matando civis inocentes - e estão -, não é objetivo do Estado israelense eliminar o povo palestino. Essa é uma guerra contra um grupo terrorista, o Hamas, que torna os palestinos reféns em seu próprio território, Gaza.
Comparar as mortes ao Holocausto é banalizar um fato histórico datado, com uma carga simbólica própria, descontextualizar a guerra atual e tentar reescrever até o passado.
Ao comparar os dois episódios, Lula responde a uma agressão (de Israel) com outra agressão (todos os judeus do mundo). O Holocausto é a maior dor que pode existir para os judeus. Logo, o presidente deseja criticar o governo de Israel e atinge não a Benjamin Netanyahu, ou seu governo, mas a todos os judeus do mundo.
Governos não são o Estado. Não se pode culpar todos os israelenses pelos erros de seu governo. Muito menos um povo, os judeus. Isso tem nome: é antissemitismo. Se entendermos o Holocausto como uma ferida aberta na História, comparar os dois fatos é algo que atinge toda a humanidade.