Depois de desperdiçar a oportunidade de se alçar como mediador do conflito entre Ucrânia e Rússia, o presidente Lula perdeu a segunda chance de se cacifar como estadista no cenário internacional, ao falhar como articulador dos oito países amazônicos para que houvesse uma declaração de Belém contundente em prol da maior floresta equatorial do mundo.
Os governantes de Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, além do próprio presidente brasileiro, saem da capital paraense, para a qual Lula transferiu a cúpula do governo há vários dias, sem mostrar ao mundo unidade em um tema fundamental para o futuro do planeta.
Faltou consenso para que fosse incluído no texto final da reunião de Belém o banimento da exploração de petróleo na floresta. Lula fez ouvidos moucos às reivindicações de organizações ambientais e colheu críticas indiretas, como a do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, segundo o qual há um "negacionismo da esquerda" em relação aos combustíveis fósseis. Não é pouca coisa um pito como esse, de um líder do mesmo campo ideológico de Lula, na semana em que o presidente brasileiro deu um golpe na ciência, ao sancionar a lei da ozonioterapia, contrariando recomendação da Academia Nacional de Medicina e de diferentes sociedades médicas.
Em Belém, faltou a Lula, líder do país que detém a maior parte da Amazônia e que propaga para a audiência global que o ambiente é prioridade e ativo fundamental de sua diplomacia, capacidade de impor agenda. Mesmo que o Brasil tenha como meta zerar o desmate até 2030, essa ambição não foi estendida ao grupo de nações e acabou ficando de fora do texto.
- Ninguém pode impor a sua vontade - resignou-se a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em entrevista, nesta quarta-feira (9).
Como havia previsto a coluna, a Declaração de Belém foi o documento possível, sem compromissos, metas ou prazos para a preservação da Amazônia. O máximo que se conseguiu foi a promessa de que se fará o possível para evitar o ponto de não retorno - quando o desmatamento extrapola um limite que permita a recuperação da floresta, porta de entrada para a desertificação.
Outro aspecto de quem faz um esforço de olhar para a metade cheia do copo: a primeira reunião em 14 anos dos oito países amazônicos, integrantes da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), já foi uma vitória. Eles não se encontravam desde 2009.
Ok. Mas é pouco dado o acelerado processo de degradação da floresta e a urgência do tema das mudanças climáticas, cujos reflexos são sentidos com mais frequência nos últimos anos várias partes do mundo e do Brasil - no Sul, em particular, com o aumento da estiagem no verão e das enchente e ciclones no inverno. No discurso final, Lula afirmou que se o "mundo rico quiser preservar efetivamente o que existe de floresta é preciso colocar dinheiro não apenas para cuidar da copa da floresta, mas para cuidar do povo que mora lá embaixo".
É terceirizando o problema que o Brasil chegará à Conferência do Clima (COP-28), em Dubai, em novembro? Melhor não embarcar. Não haverá dinheiro se os próprios guardiões da floresta, os países detentores da mata em seu território, não se mostrarem à altura do desafio.