Está quase tudo pronto para que o projeto de lei que regulamentará a atuação de plataformas digitais no Brasil vá a votação na Câmara dos Deputados. Acredita-se que o deputado Orlando Silva (PC do B-SP) apresente a iniciativa na segunda-feira (23) para votação, no máximo, na quinta-feira (26). Há quem não descarte que o texto seja apreciado em plenário ainda na segunda.
O projeto, que está há três anos em tramitação no Congresso, foi acelerado devido a vários fatores nos últimos meses: a enxurrada de desinformação que marcou o processo eleitoral brasileiro, os ataques do dia 8 de janeiro na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e, recentemente, os atentados às escolas em São Paulo e Blumenau (SC). Todos os incidentes tiveram as redes sociais como canais livres para a disseminação de fake news, incitação ao rompimento do Estado democrático de Direito e o incentivo à violência em instituições de ensino.
O texto que está nas mãos de Silva agrada, em grande parte, pesquisadores e organizações da sociedade civil que, há anos, debruçam-se sobre legislações internacionais que prevêem maior responsabilidade por parte das big techs, como Google, Meta (dona do Facebook e Instagram) e Twitter, por exemplo.
Na leitura dos especialistas, o projeto antigo não endereçava desinformação nem regulava as plataformas de forma sistêmica. Mas, no último dia 31 de março, vazou um texto, que teria sido escrito pela Secretaria de Comunicação (Secom) e pelo Ministério da Justiça como uma espécie de rascunho para a nova lei. O documento adapta a legislação da União Europeia (UE), o chamado Digital Service Act (DSA), para o contexto brasileiro.
- Esse texto ficou muito mais robusto. Como foi baseado na experiência europeia, traz muito forte a questão de transparência e análise sistêmica de riscos. E prevê multas às empresas que desobedecerem a regulamentação - diz Flora Rebello Arduini, da ONG Ekō .
A proposta traz estabelece a criação de um órgão regulador, regras para publicidade publicidade online e prevê punição sobre conteúdos como desinformação e discursos de ódio. Há também uma seção sobre remuneração de conteúdos jornalísticos por parte das big techs.
Ao chegar às mãos do relator Orlando Silva, o deputado fez modificações. Na terça-feira passada, vazou um novo texto, desta vez com a suposta versão final, feita pelo parlamentar, a ser apresentada ao plenário da Câmara. A proposta, embora ainda beba de características da legislação europeia, seria mais branda. A nova proposta de Silva expande a imunidade parlamentar para as plataformas digitais e, de alguma forma, enfraquece o ponto de transparência, coloca a maior parte de obrigações de transparência das plataformas em um anexo, o que sempre é um risco de cair fora. Agora, pesquisadores e organizações não governamentais que defendem mais responsabilidade nas redes está correndo contra o tempo para apresentar novas recomendações.
Diante da iminente votação na Câmara, as plataformas reforçaram campanhas de relações públicas para tentar adiar, mais uma vez, o debate, alegando que seria necessário mais tempo para discussão. Na Europa, pioneira no processo de regulamentação das redes, essas empresas tentaram, de diferentes formas, impedir a implementação do DSA, com campanhas publicitárias em Bruxelas (sede da UE) e em outras capitais do continente. Nos últimos dias, representantes das grandes empresas têm participado de reuniões com parlamentares e comissões no Congresso brasileiro. Não é de se duvidar que uma forte campanha publicitária contra a regulação das redes seja lançada nas ruas nos próximos dias.