Marcelo Yuka já dizia que paz sem voz não é paz. É medo. Tomo emprestada a expressão para explicar meu ceticismo em relação ao plano de 12 pontos que a China está apresentando para um fim das hostilidades na Ucrânia. O primeiro ponto é que esta, se desse certa, seria, uma paz imposta, combinada apenas com os russos, com o perdão do trocadilho. Sim, porque em nenhum momento, até onde se sabe do plano de Xi Jinping, está previsto ouvir o outro lado, a Ucrânia.
Além disso, o esboço também não diz especificamente que a Rússia deve se retirar do país invadido, e essa reivindicação ucraniana sempre foi pré-condição para qualquer negociação.
Em vez disso, o plano de Xi fala em "respeitar a soberania de todos os países", acrescentando que "todas as partes devem permanecer racionais e exercer moderação e acalmar gradualmente a situação". Muito vago.
Além disso, a proposta condena sanções unilaterais, o que se trata de uma crítica velada aos aliados da Ucrânia no Ocidente.
Cessar-fogo com a manutenção das tropas no Donbass significa a naturalização da ocupação e anexação de território ucraniano por Putin.
A negociação, por si só, entre a China e a Rússia enseja dois pontos ainda. O primeiro que Xi tem se lançado como o grande "pacificador" de conflitos pelo mundo - já conseguiu um histórico acordo entre Arábia Saudita e Irã, as duas potências rivais no mundo islâmico, no Oriente Médio. E agora se lança para a Ucrânia x Rússia. Trata-se de uma jogada geopolítica importante. Até pouco tempo atrás, quem impunha a paz, pelos seus termos, eram os Estados Unidos.
O segundo ponto é um alerta para o Brasil. Lula, que se encontrará com Xi em Pequim na semana que vem, desejava ocupar esse papel de mediador do conflito. Pode chegar quando as cartas já estiverem sobre a mesa e, o jogo, jogado. Não haverá protagonismo. É necessário cautela para não embarcar em uma proposta pronta e inócua - que, além de desagradar Joe Biden, a quem o presidente fez promessas em Washington, e não conduzir a uma paz duradoura, irá, pior, impor um cessar-fogo pelos termos de Putin e de Xi.