O maior teste de Luiz Inácio Lula da Silva depois do segundo turno começa nesta terça-feira (6), às 9h30min, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, em Brasília. É quando a proposta de emenda à Constituição (PEC) que retira do teto de gastos as verbas para o Bolsa Família será debatida e, quem sabe, votada. Se aprovada nesse fórum, seguirá para apreciação do plenário da Casa, amanhã, e, de lá, para a Câmara.
Quem acompanha a política em Brasília se acostumou a chamar essa proposta, protocolada no Senado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator do Orçamento, de "PEC da Transição". Mas a verdade é que esta, encaminhada pelo gabinete de Lula, é apenas um - e o mais generoso - dos projetos em torno de abrir furos no limite dos gastos para garantir programas sociais. Há outros três.
A proposta da equipe de transição prevê a retirada do limite de gastos de R$ 198 bilhões previstos para pagar os R$ 600 reais a pessoas carentes, além de R$ 150 por criança de zero a seis anos. Pelos cálculos, isso abriria R$ 105 bilhões para outros investimentos, como o reajuste do salário mínimo conforme a inflação. É quase unanimidade que esse valor exorbitante aumenta demais o endividamento e, por fim, não passará. A proposta mais realista é a do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que propõe retirar R$ 80 bilhões do teto da dívida por dois anos, sem contrapartidas fiscais. As PEC do senador José Serra (PSDB-SP) - R$ 100 bi acima do teto, com garantias fiscais - e da senadora Leda Barros (PDT-DF) - R$ 126 bi além do limite e alguma contrapartida - são o meio termo. É isso que estará na mesa de negociação hoje.
Após reunião com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ontem, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) indicou Alexandre Silveira (PSD-MG) como relator. Especulava-se que o próprio Alcolumbre, presidente da CCJ, assumisse a função. Mas, diante da sinalização de opositores da proposta, aliados do atual presidente Jair Bolsonaro, de pedir vista durante a sessão da CCJ, como estratégia para retardar a votação, a indicação de Silveira permite que Alcolumbre, ao se manter na presidência, determine prazos para a revisão: meia hora, uma hora, duas horas, mas não alguns dias, como preveem os adversários.
Das ironias da política: passados 37 dias de uma das eleições mais disputadas da história, Lula e Bolsonaro estão no mesmo barco: não será surpresa se o Planalto pegar carona na PEC da Transição, de Lula, para antecipar recursos para este ano a fim de aliviar o apagão da máquina pública. Mais: o presidente de saída usou as emendas de relator para conquistar apoio no Congresso. O presidente que chega prometeu acabar com elas. Mas a realidade crua impõe que, talvez, apenas com o orçamento secreto, a PEC da "Salvação" (digo, da Transição), sairá do papel.