China e Rússia, obviamente, não integram a Cúpula das Américas, que, como o próprio nome, diz é formada pelos países do continente americano. Mas as duas nações, de uma forma ou de outra, estarão presentes nos bate-papos informais, nos jantares e nas reuniões a portas fechadas do evento que começa nesta segunda-feira (6), em Los Angeles.
Seja pelos aspectos econômicos, em termos de segurança ou devido ao alinhamento ideológico de alguns governos regionais, China e Rússia aumentaram suas presenças nas Américas Central e do Sul diante da perda de interesse dos Estados Unidos ao sul do Rio Grande nos últimos 20 anos. Desde os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, a prioridade da política externa americana tem sido Oriente Médio e Guerra ao Terror (na primeira década), ascensão de China (nos últimos 12 anos) e ameaças securitárias da Rússia (de 2014 para cá, com maior ênfase desde 24 de fevereiro).
Diante da perda de importância relativa da América Latina aos olhos da Casa Branca, chineses e russos passaram a colocar os pés no continente principalmente por meio de investimentos econômicos. A China aportou seu megaprojeto de infraestrutura, chamado de Nova Rota da Seda (Belt and Road Initiative), na segunda Reunião Ministerial do Fórum China-América Latina e Caribe (Fórum China-Celac), em 2018, depois que o país se tornou o primeiro ou o segundo maior parceiro comercial de vários países da região - no caso brasileiro, é o primeiro. Já a Rússia exerce influência política no governo do ditador Nicolás Maduro - tal qual os EUA na Ucrânia, diga-se de passagem - e penetrou sua diplomacia por meio da vacina Sputnik em várias nações, a começar pela Argentina.
Aliás, em uma Cúpula das Américas marcada pela exclusão de Cuba, Nicarágua e Venezuela e pelo boicote de México e Bolívia, os países liderados por governos de esquerda ou centro-esquerda desejam que o presidente Alberto Fernández seja seu porta-voz. No entanto, essa é uma posição delicada para o argentino, que, embora com alguma solidariedade a esses regimes, pretende manter certa distância das ditaduras latino-americanas.
Fernández, assim como o presidente Jair Bolsonaro, é visto com reservas pelo governo Joe Biden por causa da Rússia. Como o brasileiro, o argentino visitou Vladimir Putin, no Kremlin, semanas antes do início da invasão da Ucrânia.
A Cúpula das Américas é uma criação dos Estados Unidos - a primeira foi realizada pelo governo Bill Clinton e teve como sede Miami, em 1994. Desde então, ocorreram outras sete - nenhuma no Brasil, o maior países da América Latina. Com risco de sediar um evento esvaziado, a Casa Branca colocou, nas últimas semanas, sua tropa de choque da diplomacia para convencer alguns líderes da região a viajar. Fernández e Bolsonaro, em lados opostos do espectro político e por razões diferentes, se uniam na ideia de não ir. Mas mudaram de posição diante da concessão americana a um encontro cara a cara com Biden. Assim, o americano também garantiu que a foto oficial do evento não será permeada de vazios.
Biden pretendia, com a Cúpula das Américas, buscar um olhar regional de sua política externa - a retomada da liderança global americana, a promoção de direitos humanos, de democracia e de ambiente. Mas a guerra na Ucrânia tomou de assalto a agenda democrata. E, assim, à fórceps, Rússia e China serão os ausentes mais presentes da reunião em Los Angeles.