Guerras são feitas de atos simbólicos, que, muitas vezes têm pouco impacto no campo de batalha, mas afetam o moral das tropas e o lado psicológico da opinião pública de um e outro lado.
No atual conflito, uma das imagens icônicas dos primeiros dias foi a destruição do Antonov, o maior avião comercial do mundo, colosso ucraniano e orgulho nacional. Depois, a fileira de 64 quilômetros de blindados que assustou Kiev e o mundo, mas nunca chegou a seu destino. E então, havia Lviv, cuja inviolabilidade durou quase um mês e só nesta segunda-feira (8) foi atingida mais duramente e perto de seu centro. Antes disso, depois de tanto ser massacrada, também a Ucrânia desferiu um ataque aos russos, do outro lado da fronteira. Nessa guerra de Davi contra Golias, a ofensiva de 1º de abril contra um depósito de combustível em Belgorod, do lado russo, também é simbólico.
Estamos diante de mais um ícone nesse conflito. Não se sabe ainda exatamente - e talvez nunca se saiba - o que ocorreu com o Moskva, o gigantesco cruzador, conhecido como "assassino de porta-aviões" e mais poderoso navio russo no Mar Negro. O Kremlin diz que houve uma explosão a bordo e ele naufragou enquanto era rebocado até o porto. A Ucrânia afirma que um de seus mísseis, o Neptune, levou a pique a máquina de guerra de ferro e aço russa.
O fato é que dificilmente o Kremlin conseguirá esconder de sua população as chamas do Moskva. Ainda que os telejornais tenham repetido a versão oficial do governo, as cenas do navio sendo consumido pelo fogo estão em todas as redes sociais.
Com 12.490 toneladas e capacidade para 500 tripulantes, o Moskva é símbolo do poder naval russo. A embarcação, construída no final da era soviética, participou das principais guerras que o país se meteu, desde que foi comissionado. Na Geórgia, em 2008, bloqueou a costa do país e levou ao desembarque de uma infantaria naval na Abecásia. Participou de operações na Síria e na anexação da Crimeia, em 2014. No atual conflito na Ucrânia, apoiou outras embarcações que disparavam contra as cidades inimigas.
Carregava 16 mísseis anti-navio do sistema P-1000 Vulkan, com alcance de pelo menos 700 quilômetros, sistemas de defesa aérea de longo alcance, capazes de proteger de ataques inimigos, uma esquadra inteira. Era basicamente o que fazia na costa da Ucrânia nesses dias.
Seu naufrágio, a ser confirmado que por tiro inimigo, já é comparável à derrocada de outro colosso da engenharia de guerra, o ARA General Belgrano, argentino, que foi torpedeado por um submarino britânico nas águas do Atlântico Sul, na Guerra das Malvinas, em 1982. Na ocasião, morreram 323 marinheiros. A Rússia diz que, no caso do Moskva, todos os tripulantes foram resgatados.
O naufrágio do Moskva, se for confirmado que por ataque, pode levar os demais navios russos a operarem mais distantes da costa, por temores de novas ofensivas. Mas seu impacto psicológico é maior: a Rússia e sua marinha, a força predileta de Vladimir Putin, podem não ser tão poderosas assim. A se confirmar um ataque, pode-se inferir falhas graves na defesa aérea russa. A se confirmar um acidente, pode-se sugerir, no mínimo, problemas de segurança ou negligência.