- I can't breathe.
- Eu não consigo respirar.
Há exato um ano, essa apelo dramático saía da boca de George Floyd, que balbuciava as palavras enquanto um policial branco, Derek Chauvin, asfixiava seu pescoço com o joelho durante nove minutos e 26 segundos em Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos.
O assassinato do homem de 46 anos poderia ter entrado apenas para as estatísticas dos negros e negras caídos pela ação das forças policiais em um país onde o racismo estrutural é uma chaga aberta na sociedade. Não. George Floyd não apenas virou nome de rua, praça, memorial ou lei. Entrou para a história ao despertar uma nova onda de indignação na luta contra o segregacionismo, mesmo enquanto boa parte do mundo vivia quarentenas devido à pandemia. O movimento Black Lives Matter ganhou protagonismo à frente da indignação.
Nos Estados Unidos e em outras cidades fora das fronteiras americanas, sua morte inspirou movimentos por justiça social. Em Minneapolis, Nova York, Los Angeles e outras metrópoles, foram pelo menos 10 dias de revolta, com manifestantes nas ruas. Dentro e fora dos EUA, estátuas de personalidades associadas à escravidão foram retiradas de locais públicos e depredadas. Um dos símbolos, a imagem de Edward Colson, um traficante de escravos, acabou jogado em um rio no Reino Unido, ato número 1 da revisão de estátuas que homenageiam figuras racistas no país.
Internamente, várias cidades americanas começaram a debater a reforma de suas forças policiais, banindo práticas de abordagens violentas. Em nível federal, em 3 de março a Câmara, em Washington, aprovou uma reforma policial apresentada pelo Partido Democrata para proibir essas táticas em todo o país - entre elas a imobilização com o joelho usada contra Floyd.
O assassinato também mexeu com o direcionamento da verba pública para as corporações. Em Nova York, por exemplo, o prefeito Bill de Blasio garantiu que direcionará parte da verba voltada à polícia para serviços sociais. Medidas como essas, no entanto, enfrentam oposição de políticos republicanos e do poderoso lobby de sindicatos policiais, bem financiados e com expressiva influência eleitoral.
Aliás, falando em política, a morte de Floyd movimento a já agitada campanha eleitoral americana. O então presidente Donald Trump tentou, com o episódio, angariar mais apoio da direita, colocando-se como "o presidente da lei e da ordem", considerando os manifestantes baderneiros e visitando corporações policiais. O então rival Joe Biden, em oposição, ouviu o som das ruas, colocou-se ao lado dos manifestantes e visitou a família de Floyd.
A onda contra o racismo estrutural levou Kamala Harris a desbancar candidatos brancos e ocupar a vice-presidência na chapa de Biden. A escolha foi decisiva para os democratas voltarem à Casa Branca com o apoio da comunidade negra, que garantiu a vitória em redutos tradicionais dos republicanos, como a Geórgia, um dos fiéis da balança do pleito.
Biden também colocou a redução das disparidades raciais como princípio ordenador do governo.
Na Justiça, o policial Derek Chauvin foi condenado por três acusações de homicídio em 20 de abril deste ano, após três semanas de julgamento. O juiz deve publicar a sentença em dois meses, e ele pode pegar até 40 anos de reclusão. Os outros três policiais que acompanharam a cena e não fizeram nada para impedir o colega serão julgados em agosto.