Dois países pouco comentados no noticiário internacional, Mongólia e Butão vacinam mais contra a covid-19 do que o Brasil, são campeões na Ásia (excetuando-se algumas nações do Oriente Médio) e vencem praticamente todos os países da União Europeia, menos a Hungria. Conforme o monitor da Universidade de Oxford, Mongólia aplica 87,62 doses para cem habitantes, índice superior inclusive ao dos Estados Unidos (86,93 doses para cem habitantes). Butão registra 62,56 doses para cem habitantes, quantidade maior também do que todos os países da Ásia e da Oceania, na proporção da população.
Questões geopolíticas são parte da explicação. O Butão, reino espremido entre Índia e China, é uma espécie de colchão amortecedor entre os interesses das duas potências asiáticas, que disputam hegemonia na região. Logo, o país é alvo da influência desses dois.
A Índia, país produtor de imunizantes, tem uma ousada diplomacia da vacina, tanto que começou a exportar produtos para outras nações da região antes mesmo de começar a administrar doses em sua própria população. Trata-se de uma ação para projetar influência para contrabalançar poder chinês na área. O Butão recebeu doações da vacina Oxford/AstraZeneca, produzidas pelo Instituto Serum e doadas pela Índia.
O caso da Mongólia é semelhante, porém mais complexo porque, além de China e Índia, o país recebe influência política da Rússia. Vacina sua população aceleradamente com doses da Sputnik V, de Oxford/AstraZeneca e da Sinopharm/Beijing.
Nesses casos, como são alvo do interesse dessas nações, Butão e Mongólia são favorecidos por grandes quantidades de vacina.
Mas, claro, não são apenas questões externas que explicam a aceleração das campanhas nos dois países. O Butão, um país pobre, tem uma população pequena (778 mil habitantes), mas contava, no início da pandemia com apenas 338 médicos. Mas o governo liderado pelo primeiro-ministro Lotay Tshering, que também é médico, conseguiu conter a disseminação do coronavírus por meio de uma rigorosa quarentena de quem ingressasse no país, montou um plano de detecção e rastreamento de pessoas infectadas e distribuiu kits de desinfetantes, máscaras e analgésicos, doados pela Índia. A vacinação conta com um corpo de voluntários, chamados de De-Suung (Guardiões da Paz), que operam sob a autoridade do rei do Butão, Jigme Khesar Namgyel Wangchuck, e que alcançam os grotões do país, boa parte dele montanhoso. O país também aproveitou a logística de campanhas anteriores. Resultado: em 16 dias de mutirão, o país havia vacinado 93% dos adultos.
Desho Dechen Wangmo, ministro de Saúde do Butão, disse ao The New York Times que o sucesso se deve à "liderança do rei, solidariedade pública, ausência de hesitação vacinal e um sistema de atenção primária à saúde que permitiu levar os serviços ao máximo de partes remotas do país".
A Mongólia, durante praticamente todo o ano de 2021 não teve casos de coronavírus – até hoje registra baixo índice de infectados e mortos. Conteve o patógeno por meio de rigorosos controles de fronteira, confinamentos e restrições impopulares. O descontentamento se transformo em fúria após a divulgação na TV de um vídeo em que aparece uma mãe que parecia ter dado à luz sendo transferida de um hospital para um centro de tratamento de doenças infecciosas. A mulher vestia apenas um pijama em meio ao frio de 25 graus negativos. A crise levou à renúncia do governo.
Ainda assim, o país tem tirado proveito de seu posicionamento geográfico, entre Rússia e China, e tem vacina suficiente para toda a população adulta.