Quem imaginava que a pressão sobre a China iria diminuir no governo Joe Biden enganou-se. Muda a abordagem – até agora, pelo menos, dentro da diplomacia e dos fóruns internacionais, diferentemente dos arroubos e insultos de Donald Trump. Mas prepare-se: a temperatura será elevada. Nesta quarta-feira (26), Biden ordenou que as agências de inteligência apresentem, em 90 dias, um relatório sobre a origem do coronavírus.
Grosso modo, a ideia é coletar e analisar informações que possam determinar se o patógeno causador da covid-19 surgiu, de fato, de uma fonte animal, como tem dito desde sempre o regime chinês, ou se teria vazado do Instituto de Virologia de Wuhan.
A entrada em cena da Casa Branca veio após a reportagem do The Wall Street Journal afirmar que três cientistas do laboratório apresentaram sintomas semelhantes a da covid-19 no final de novembro. Eles teriam sido inclusive hospitalizados. A China só reportou oficialmente o primeiro caso da doença à Organização Mundial da Saúde em 30 de dezembro e nada falou sobre os pesquisadores.
Após a publicação da matéria, esta semana, os pedidos por uma investigação mais profunda se multiplicaram - inclusive por parte da comunidade científica.
As autoridades chinesas acusaram o governo americano de disseminar teorias "conspiratórias". "Alguns nos Estados Unidos espalham teorias de conspiração e informações falsas, como a hipótese de um erro de laboratório", disse o porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Zhao Lijian, à imprensa.
"Se os Estados Unidos querem ser realmente transparentes, deveriam, como a China faz, convidar os especialistas da Organização Mundial da Saúde (OMS) para investigar na base militar de Fort Detrick, assim como em todos os laboratórios biológicos do mundo", acrescentou Zhao, referindo-se ao Instituto de Doenças Infecciosas do exército americano.
O problema é que as dúvidas que pairam sobre a origem do coronavírus só foram alimentadas justamente pela falta de contundência da OMS no relatório final e por culpa da própria China, que não permitiu que os cientistas da organização internacional, que ficaram quatro semanas em Wuhan, tivessem liberdade para visitar lugares fundamentais para a investigação e conversassem com funcionários do regime de forma independente.
A montanha pariu um rato. O resultado da esperada investigação reforçou a hipótese do surgimento a partir do contato de humanos com animais no mercado de Wuhan, mas não foi contundente o suficiente - nem apresentou evidências - para descartar a ideia do vazamento. Como pontuou a coluna à época, o documento deixou todos com a pulga atrás da orelha.
Até a comunidade de inteligência de americana pode, ao fim dos 90 dias, dizer o mesmo, que "não há evidências", ou que as "informações são insuficientes", mas que ao menos não caia no erro de deixar portas abertas para teorias de conspiração - ou que seu trabalho seja contaminado por interesses políticos.