O impeachment de Donald Trump passou na Câmara dos Deputados, a House of Representatives americana, mas deve ser barrado no Senado.
Fosse apenas por essa afirmação, os fatos desta tarde de quarta-feira (13) em Washington soariam como notícia velha, a reprise de uma novela que vimos em 2019. É preciso ficar atento aos detalhes para entender as nuances da política americana neste momento inédito e o peso da decisão da Câmara.
Trump é o primeiro presidente a sofrer dois processos de impeachment da história dos Estados Unidos. Trata-se de um constrangimento político sem precedentes. A essa altura, a uma semana de deixar a Casa Branca, chefes de Estado estão mais ocupados em conduzir os últimos dias de mandato na ponta dos dedos, de forma a não manchar seu legado. Trump, ao contrário, vive o epílogo de seu governo isolado, cercado por bajuladores reais e virtuais e em estado de negação da gravidade do que fez ao incitar apoiadores, alguns armados, contra o Congresso no último dia 6.
Trump é alvo de uma acusação extremamente séria, que é a incitação à insurreição.
A sessão desta tarde mostrou que há uma clara revolta interna no Partido Republicano, com o afastamento de correligionários do presidente. Em 2019, nem um único deputado da legenda votou a favor do impeachment de Trump. Desta vez, 10 congressistas republicanos optaram pelo afastamento do presidente.
A proposta provavelmente não irá passar, de novo, pelo Senado. Seriam necessários que 17 republicanos traíssem o partido (Mitt Romney já se manifestou favorável). Mas a sinalização de que o poderoso líder da maioria na Casa, Mitch McConnell, um dos caciques do Partido Republicano, integrante da tropa de choque de Trump ao longo dos últimos quatro anos, seria favorável ao impeachment é um claro sinal da falência do governo. Significa também que muitos republicanos, entre eles o poderoso senador, desejam se livrar de Trump e do trumpismo para reformar a legenda.
A votação na Câmara ocorreu exatamente uma semana depois de o Capitólio ter sido invadido por militantes enfurecidos. Mesmo que não passe pelo Senado, o impeachment na Casa é um claro sinal de que as instituições, regras e normas da democracia são mais fortes do que os ímpetos de um governante - e que, por mais que elas tenham sido corroídas pela administração Trump, seguem de pé. O sistema de pesos e contrapesos tem falhas, mas mostrou sua eficiência ao, senão punir, ao menos constranger politicamente o chefe do Executivo por uma das acusações mais sérias que se pode fazer contra um presidente - provocar uma insurreição, que causou morte e destruição no espaço mais sagrado da República, o parlamento.