Vem livro polêmico por aí. O governo do presidente americano, Donald Trump, apresentou uma ação judicial para tentar evitar a publicação da obra do ex-assessor de Segurança Nacional John Bolton.
O trabalho promete revelar informações até agora mantidas sob sigilo (até por razões estratégicas) sobre os bastidores do poder nos Estados Unidos. Uma delas seria de como, em 2019, Trump teria pedido ao presidente chinês Xi Jinping ajuda para se reeleger. Ele teria dito que o poder econômico do gigante asiático poderia afetar campanhas políticas e teria pedido ao governo comunista chinês que comprasse maior quantidade de trigo e soja antes das eleições para favorecê-lo nas urnas, em especial nas regiões rurais dos Estados Unidos. Verdade ou não, o fato é que a China tem importado mais soja dos americanos graças a um acordo comercial assinado em janeiro.
A cinco meses da eleição, a informação de que Trump teria pedindo apoio a seu principal adversário geopolítico atual, aquele a quem, na frente das câmeras e no Twitter costuma atacar, seria algo imperdoável para seus eleitores mais fiéis.
A ação para evitar a publicação do livro, apresentada ao tribunal federal de Washington DC, diz que Bolton não deixou que o texto fosse examinado, o que significa que seu livro estaria em “descumprimento claro” dos acordos assinados para chegar ao cargo e obter acesso a informação sensível. O livro chama-se" The Room Where It Happened: A White House Memoir" ("A sala onde aconteceu: uma memória da Casa Branca, em tradução livre"). Bolton, polêmico por suas opiniões sobre o Irã, a Rússia e a Venezuela, ocupou o cargo estratégico de consultor do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca entre abril de 2018 e setembro de 2019. Ele deixou a função depois de discordar da aproximação de Trump a Coreia do Norte e o Talibã no Afeganistão. No início do ano, com partes do livro vazando para a imprensa, advogados da Casa Branca alegaram que grande parte do material era classificada como informação sigilosa.
Em 2018, Bolton esteve no Brasil, ocasião em que visitou o então presidente eleito Jair Bolsonaro. O americano foi recebido pelo brasileiro com um gesto de continência.
Nesses quatro anos de mandato republicano, vários livros sobre os bastidores da Casa Branca foram lançados, a maioria prometendo "detalhes explosivos" de dentro do Salão Oval, o gabinete do presidente dos EUA. Um dos primeiros a causar estardalhaço e a tirar o sono do líder americano foi "Fogo e Fúria", escrito pelo jornalista Michael Wolff.
Logo veio uma obra arrebatadora, Medo: Trump na Casa Branca, de Bob Woodward, o jornalista que melhor conhece o que se passa na residência da Avenida Pensilvânia, 1.600, em Washington (o endereço da Casa Branca). É o livro definitivo sobre a gestão de Trump, pelo nome do autor, o repórter que revelo o escândalo de Watergate ("Todos os homens do presidente", livro e filme recomendadíssimos), no governo Richard Nixon, e que acompanhou passo a passou outros presidentes - escreveu livros sobre Bill Clinton ("The Agenda", sobre o primeiro mandato, e "The Choice", sobre a reeleição), George W. Bush ("Bush em Guerra" e "Plano de Ataque"), Barack Obama ("Obama's War"), sobre os segredos da CIA ("Veil: The Secret Wars of the CIA"), a cadeia de comando do Pentágono e suas relações polêmicas ("The Commanders"), para ficarmos nos mais conhecidos - nem todos com tradução em português. É, sem dúvida, o jornalista que faz tremer a Casa Branca, independentemente de ela estar nas mãos de republicanos ou democratas.
Há também as obras de ex-funcionários do governo, como o de Bolton. Três meses após o lançamento da obra de Bob Woodward, o ex-diretor do FBI James Comey anunciou "A Higher Loyalty - Truth, Lies and Leadership" ("Uma nova lealdade - Verdade, Mentiras e Liderança"). Comey era personagem-bomba em Washington. Foi ele quem abriu investigações sobr eo suo de servidor privado de e-mail por Hillary Cklinton em seu período como secretária de Estado e a suposta interferência russa na eleição de 2016, a favor de Trump. Demitido pelo então novo presidente, ele contou ao Senado o que sabia das supostas ligações do republicano com o Kremlin e como teria sofrido pressão para jogar a sujeita para debaixo do tapete de sua sala no J. Edgar Hoover Building, famoso prédio sede do FBI.
A obra de Bolton, agora lançada, tem o mérito de mostrar, por dentro, a tomada de decisões de Trump a partir de uma testemunha ocular e, muitas vezes, participante. Mais: Bolton foi um dos principais falcões da Casa Branca nas últimas décadas, com envolvimento direto nas vezes em que os governos americanos foram à guerra, como no Afeganistão, em 2001, e no Iraque, em 2003. Tem muito a revelar não só do governo Trump, mas também de Bush pai e Bush filho. Suas frases tiram o sono não só do atual presidente, mas de boa parte do establishment de Washington.