Não é só a Venezuela de Nicolás Maduro que o governo brasileiro emula ao omitir dados sobre o avanço do coronavírus no Brasil. Se você entrar no mapa da Coreia do Norte, na plataforma da Organização Mundial da Saúde (OMS) com as estatísticas da pandemia, verá que lá, no reino da fantasia do ditador comunista Kim Jong-un, há zero mortes e infectados. A nação mais fechada do mundo faz fronteira terrestre e tem como principal parceiro econômico e político a China, onde o vírus surgiu.
Aliás, a própria China também tem muito a explicar sobre a origem da doença em Wuhan. Costumeiramente, o país e seu regime de partido único, o Partido Comunista Chinês, são alvos de críticas de setores do governo Jair Bolsonaro - entre eles, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, além do filho do presidente, Eduardo Bolsonaro - pela falta de transparência das estatísticas sobre covid-19. Boa parte da comunidade internacional duvida de que o país de 1,3 bilhão de habitantes tenha "apenas" 4,6 mil mortos. Mas como confiar nos números de um governo autoritário como o chinês?
No Turcomenistão, país governado por um autocrata chamado Gurbanguly Berdimuhamedow, não apenas não há supostamente mortos e doentes por covid-19 (outro branco no mapa da OMS), como o governo proibiu o uso do termo "coronavírus". Quem falar ou escrever essa palavra pode ser preso ou multado.
Não é preciso ir longe para buscar exemplos de dados duvidosos. Maquiar estatísticas ou usar os números conforme seus interesses é normal em tempos também de eleição. Em seu primeiro período na Casa Rosada, a ex-presidente Cristina Kirchner, hoje vice na Argentina e a quem Bolsonaro tem como desafeto, fazia malabarismos para esconder os números oficiais. Por anos, era impossível saber, com certeza, a inflação e o nível de desemprego no país vizinho. Qualquer estatística pública era alterada de acordo com interesses do governo, desde que Néstor Kirchner, marido de Cristina, interveio no Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec, órgão oficial de estatísticas, semelhante ao IBGE), em 2007. No reino de faz-de-conta dos Kirchner, nada era o que parecia. O governo retirou de postos-chave os técnicos do terceiro andar do Indec que calculavam a inflação. Foi o ato inicial da manipulação de dados. Passou a ser impossível planejar rumos da economia, medir investimentos privados ou calcular os gastos na hora de consultar o extrato bancário. Não se sabia sequer quantos pobres havia na Argentina. Nem o câmbio era o que parecia.
No caso dos dados confusos do governo brasileiro sobre o coronavírus, que levou a Universidade Johns Hopkins nos EUA a interromper a contagem de dados no Brasil no sábado, é ainda mais grave porque, navegando no escuro, não se pode planejar como salvar vidas. Cristina Kirchner, Xi Jinping, Nicolás Maduro... O governo Bolsonaro se tornou o espelho dos líderes de esquerda que sempre criticou.