Os estrategistas da Casa Branca parecem ter passado da fase da guerra verbal para a ação. A seis meses da eleição nos Estados Unidos e com a economia global aos frangalhos, há uma crescente urgência do governo Donald Trump em não só culpar a China pela origem do coronavírus, mas também em angariar apoio diplomático de aliados para que façam o mesmo.
Entre as opções de retaliação que estão sendo discutidas está a imposição de tarifas adicionais sobre produtos chineses, em especial no setor de tecnologia. Mas, se o governo americano está confiante de que a China deveria indenizar o mundo pela devastação do coronavírus, os europeus ainda têm dúvidas. Reino Unido, França e Alemanha pedem mais explicações sobre a origem da covid-19.
Não há dúvidas de que a pressão sobre a China irá aumentar nas próximas semanas em nível global. Mas, enquanto os governos não tomam uma atitude prática em relação à suposta culpa chinesa - senão pela origem, ao menos por negligência e má gestão da crise -, o que um simples indivíduo pode fazer?
Como Davi diante de Golias, um cidadão português decidiu cobrar na Justiça danos patrimoniais e imateriais causados supostamente pela China a Portugal pela pandemia. Uma ação popular exige que o governo de Pequim pague quase 17 milhões de euros ao governo português.
O processo é movido por Lucas Alexandre Laires Matos, morador da cidade de Penalva do Castelo, distrito de Viseu, província de Beira Alta, no centro do país. Seu advogado, Anselmo Ferreira Melo Costa, disse no processo haver de fato "uma situação de calamidade pública e que a sociedade portuguesa e suas empresas vêm sofrendo danos patrimoniais, pessoais e sociais de grande relevância causados pela atuação negligente do governo da China".
O valor da ação, incomum até agora na atual pandemia, equivale ao déficit de Portugal calculado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Anselmo Costa alega que já são dois meses de crise e que a previsão é que ela dure até dezembro e "as empresas continuarão a confrontar-se com o conjunto de compromissos financeiros habituais perante bancos, fornecedores, trabalhadores, fisco e segurança social, mesmo com receitas fortemente reduzidas e inexistentes em alguns setores". O advogado alega que o governo chinês "nada fez para alertar a população mundial" nem tentou "controlar o vírus em seu próprio país a fim de que não se propagasse". Ele ainda acusa a China de tentar ocultar a real situação do surto e diz que médicos teriam sido censurados.
A Justiça portuguesa deve se pronunciar nos próximos dias sobre a ação. Individualmente, há pouco que se possa fazer - ainda mais diante da falta de um órgão de justiça internacional capaz de julgar suposta responsabilidade. Mas, se a moda pega, a pressão popular pode fazer ao menos com que governos europeus que titubeiam em pressionar a China a descer do muro e exigir respostas ainda silenciadas pelo regime chinês sobre a origem do vírus.