A invasão da embaixada da Venezuela em Brasília por apoiadores de Juan Guaidó coloca o bode na sala da reunião entre os líderes dos Brics (grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), que começa hoje na capital federal. As crises na Venezuela e na Bolívia eram assuntos que o governo brasileiro pretendia evitar durante o encontro desta quarta (14) e quinta-feira (14) porque opõem frontalmente pontos de vista do presidente Jair Bolsonaro e dos líderes da Rússia, Vladimir Putin, e da China, Xi Jinping.
A invasão da representação diplomática provoca dois problemas imediatos: obriga o Itamaraty a reforçar posição a favor do autoproclamado presidente venezuelano em clara oposição a Putin e Xi.
Putin tem sido o fiador do regime venezuelano de Nicolás Maduro, diante das pressões dos Estados Unidos no continente pela saída do bolivariano. Enviou armas, avião e, suspeita-se, apoiou a ação de mercenários em Caracas.
O outro problema é de imagem: guardadas todas as excentricidades do caso venezuelano — um país com dois presidentes —, uma embaixada é território inviolável. A invasão de uma representação diplomática é fato grave, que expõe o Brasil como um país incapaz de garantir a segurança de funcionários estrangeiros em plena conferência dos Brics, quando estão por aqui quatro líderes de nações importantes — duas delas, potências globais.
Nesta manhã de quarta-feira, em meio à confusão em frente ao prédio em Brasília, o encarregado de negócios da embaixada, Freddy Efrain Meregote Flores, convocou a solidariedade dos movimentos sociais e partidos políticos brasileiros para evitar a entrada dos invasores. Ora, quem tem de proteger um prédio diplomático não são movimentos sociais ou legendas, é o Estado onde ela está instalada. É obrigação do Brasil garantir a segurança das instalações e dos diplomatas. A polícia militar foi acionada.
À frente da ocupação está o Tomás Silva, ministro-conselheiro e número 2 de María Teresa Belandria (a embaixadora indicada por Guaidó reconhecida pelo governo brasileiro, que está nos EUA). Nas entrelinhas do ato está uma clara tentativa da oposição venezuelana de aproveitar o episódio da renúncia de Evo Morales na Bolívia para pressionar pela saída de Maduro. Uma grande manifestação convocada por Guaidó está prevista para ocorrer no sábado, em Caracas.
Pelo Twitter, o ministro das Relações Exteriores de Maduro, Jorge Arreaza, responsabilizou o governo Bolsonaro pela invasão: "Responsabilizamos o governo do Brasil pela segurança de nossa equipe e das instalações e exigimos respeito pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas".
O impasse venezuelano faz com que haja duas representações diplomáticas do país vizinho no Brasil — a que sempre existiu, onde estão os funcionários do governo Maduro (o país está sem embaixador aqui desde 2016, em protesto pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff) e outra, informal, onde trabalha María Teresa, em um flat, perto do Lago Paranoá. Além da embaixada de Maduro, a Venezuela conta com seis consulados no país — nenhum no Rio Grande do Sul.
Ainda que tenha reconhecido Guaidó e concedido as credenciais diplomáticas para a embaixadora indicada por ele, o Itamaraty não revogou as imunidades e privilégios cedidos aos funcionários diplomáticos indicados por Maduro por temer represálias contra brasileiros que estão em Caracas.