Repórter da agência de notícias EFE, o espanhol Gonzalo Domínguez, 32 anos, passou 12 horas detido na sede do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), no oeste de Caracas, pelas forças de Nicolás Maduro.
O jornalista, que trabalhou por um ano no Rio de Janeiro antes de se mudar para Bogotá, onde atua como correspondente, havia chegado à capital da Venezuela no dia 24. Na quarta-feira (30), foi preso por volta das 21h no hotel em Caracas, ao lado da colega de agência, a colombiana Maurén Barriga.
Cinco oficiais do Sebin os aguardavam. Pela manhã, outros dois companheiros da equipe, o fotógrafo colombiano Leonardo Muñoz e o motorista venezuelano Jorge Sallas, haviam sido detidos. Todos foram libertados na quinta-feira. Gonzalo relatou o episódio à coluna na manhã desta sexta-feira.
Como tudo aconteceu?
Tudo começou por volta das 11h30min, quando Leonardo Muñoz, fotógrafo, e Jorge Sallas, o motorista, desapareceram. Não tínhamos mais contato com eles, não sabíamos nada. Em uma cidade como Caracas, podíamos imaginar que pudesse ter ocorrido algum crime, algum acidente ou que tivessem sido detidos, como acabou acontecendo. Então, os advogados da EFE passaram a percorrer todos os centros de detenção de Caracas, dos diferentes organismos, entre eles o Sebin. Nunca lhes deram informações. Por volta das 21h, minha colega (Maurén Barriga) e eu, fomos ao hotel descansar e seguir monitorando dali a situação, ver o que poderíamos fazer. Os oficiais estavam nos esperando no hotel. Havia cinco pessoas. Disseram que tínhamos de ir com eles, que estavam armados e que tínhamos de ir ao Helicoide (como é conhecida a sede do Sebin) para fazer uma entrevista, que é como chamam o interrogatório.
Como foi a partir daí?
Fomos levados ao Helicoide, que é o centro de detenção. Antes de ir, consegui mandar uma mensagem à diretora da EFE em Caracas e dizer que estavam nos levando. Como ela estava muito perto, apresentou-se com dois advogados. E eles nos acompanharam até o Helicoide, mas não os deixaram passar.
Você passaram a noite toda retidos?
Sim. Lá nos encontramos com Leonardo e José. Passamos ali toda a noite sendo interrogados uma vez, outra vez e mais outra vez... Repetiam constantemente as mesmas perguntas: "Por que estão aqui?"
Vocês disseram que eram jornalistas desde o princípio?
Desde o princípio dissemos que somos jornalistas. Quando passamos a fronteira, dissemos que éramos jornalistas. Houve uma coisa curiosa: viemos como reforço para trabalhar na Venezuela diante da quantidade de notícias que existe aqui. E lá (na fronteira) nos perguntavam constantemente: por que havíamos vindo para Venezuela ajudar nossos colegas? Por que não havíamos ido ao Brasil ou à Argentina, porque nesses países havia mais notícias?
O que queriam dizer com isso?
Não sei, sinceramente, o que passava pela cabeça deles.
Durante a detenção, vocês ficaram todos na mesma sala?
Sim, estivemos juntos durante todo o tempo. Em alguns momentos, de dois em dois, porque o interrogatório de Leonardo e José já havia terminado. Então interrogavam Maurén e eu. Estávamos juntos. José e Leonardo estavam em uma sala contígua, mas estávamos todo o momento próximos uns dos outros. Estivemos juntos durante horas.
E vocês conseguiam falar entre si?
Sim. Podíamos falar.
Não era uma cela?
Estivemos em três lugares. Uma sala, não era cela. Depois, estivemos em um sótão, onde faziam fotos de detenção, onde estavam os logos do Sebin (para cenário) para fazerem foto frontal. Também ficamos em um corredor, onde não havia janelas, nenhum tipo de ventilação.
Tiraram os celulares de vocês?
Tiraram os celulares, nos pediram que desbloqueássemos os aparelhos e os levaram. Viram todo o conteúdo de nossos telefones, tanto profissional quanto pessoal. Viram as fotos pessoais e profissionais e conversas de WhatsApp. Olhavam e vinham perguntar: "Tu tens uma foto de tal coisa, tens uma conversa com fulano de tal, por que tens esta conversa?" Assim ocorria constantemente.
E lhes deram comida?
Sim, o tratamento foi muito bom. Eles nos deram comida, água e nos levaram ao banheiro quando precisávamos. Quando nos levavam de um lado a outro, eles o faziam com bastante educação. Nesse sentido, não estava mal.
Quanto tempo vocês ficarem retidos no total?
Maurén e eu estivemos (retidos) por 12 horas. Leonardo e Jorge, por 24 horas.
Era possível dormir?
Estávamos em um sofá, sentados durante muitas horas. Dormimos apenas alguns minutos, é muito difícil dizer quanto tempo estivemos ali.
Eles acompanharam vocês até o aeroporto?
Eles nos levaram ao escritório de controle de migração, parecia que iriam nos deportar. De repente, no último minuto, quando já estavam decidindo como fariam... No meu caso, sou espanhol, estavam decidindo se me mandavam para a Espanha. De uma hora para outra, disseram que estávamos livres e que poderíamos ir embora.
Vocês seguem na Venezuela trabalhando?
No momento, estamos decidindo se ficaremos ou iremos embora. (Estamos vendo) Se há permissão definitiva para continuar e seguir fazendo nosso trabalho. A situação está bastante difícil. Depois de um caso como esse, sempre se fica emocionado.
Durante a reclusão, eles perguntavam algo relacionado ao governo de Espanha, por exemplo, no seu caso?
Não perguntaram nada sobre o governo de Espanha nem a meus companheiros da Colômbia sobre o governo colombiano.