Os protestos violentos que incendiaram Paris no fim de semana levaram o governo do presidente Emmanuel Macron a recuar em algumas medidas que elevavam o preço dos combustíveis. As manifestações na França guardam semelhanças com a greve dos caminhoneiros que paralisou o Brasil em maio. Veja abaixo o que está em jogo.
1) O que está acontecendo na França?
Durante três sábados consecutivos, houve protestos gigantescos por todo o país, alguns deles muito violentos. No último dia 1º, por exemplo, várias pessoas ficaram feridas, lojas foram fechadas na famosa Champs Elysées e o Arco do Triunfo acabou vandalizado. A exemplo do que ocorreu no Brasil em maio, quando caminhoneiros bloquearam estradas país afora, na França, os motoristas também interromperam o tráfego nas estradas nacionais. Outra semelhança com o movimento brasileiro é que não há comando claro. Eles se autodenominam "Coletes Amarelos", em uma referência ao acessório que todo motorista deve levar no carro como item de segurança na França.
2) O que querem os manifestantes?
Há uma extensa lista de reivindicações. Mas dois pontos são principais: o anúncio pelo governo do aumento da alíquota sobre combustíveis, que entraria em vigor em 1º de janeiro e um processo de convergência de preços do diesel e da gasolina. Também pleiteiam o aumento do salário mínimo _ hoje em 1,5 mil euros (R$ 6,5 mil). Também protestam contra o aumento das tarifas de energia elétrica, o maior rigor na vistoria periódica de veículos e a extinção do imposto sobre fortunas. O pano de fundo é a redução do poder aquisitivo pela classe média.
3) Há semelhanças com o movimento dos caminhoneiros no Brasil?
Apenas em parte. Embora haja caminhoneiros no grupo dos coletes amarelos, o movimento é muito mais diverso. Há aposentados, artesãos diaristas, desempregados, operários e pequenos empresários.
No caso dos caminhoneiros brasileiros, eles basicamente reclamavam da disparada no preço do óleo diesel, ainda que intervenção militar tenha entrado na pauta. No caso francês, as exigências são mais amplas — há até quem exija a renúncia do presidente Emmanuel Macron.
Há duas semelhanças. A primeira, a falta de uma liderança unificada. A segunda, o modus operandi: bloqueio de estradas. Na França, as manifestações incluem atos de violência urbana.
4) O que fez o governo francês?
A exemplo do governo brasileiro no caso dos caminhoneiros, Macron recuou em algumas medidas. Congelou por seis meses o reajuste da taxa sobre combustíveis e a convergência de preços do diesel e da gasolina, além de suspender o aumento da tarifa de eletricidade ao menos até maio de 2019.
Esta é a primeira grande derrota para o presidente, eleito em 2017 com mais de 20 milhões de eleitores (66% dos votos) com a promessa de renovação da política francesa. Seu movimento, En Marche! (Em Marcha!), venceu com a promessa de não representar nem a esquerda nem a direta. Pela primeira vez desde 1958, data da fundação da República moderna francesa, que os dois partidos tradicionais, o Socialista e o Republicanos, ficaram de fora do Palácio do Eliseu. Um dos erros do governo foi ter acreditado que, por dispor de muita popularidade, poderia implementar seu pacote de reformas sem negociar com a oposição e sem mediação dos poderosos sindicatos franceses. O excesso de confiança deve-se ao fato de o governo ter obtido vitórias, fazendo passar a reforma trabalhista e a reforma das linhas ferroviárias públicas, ambas aprovadas sem maiores contratempos.
5) Como está a situação?
A oposição dize que a suspensão temporária do aumento dos preços dos combustíveis não é suficiente. Querem o cancelamento total da medida. Nos bastidores, a extrema direita e a esquerda populista exigiram a dissolução da Assembleia Nacional e eleições legislativas antecipadas. A direita de tradição moderada quer um referendo.
A posição dos camisas amarelas é difícil de compreender devido ao fato de não haver um comando claro. Mas alguns representantes já afirmaram que não aceitarão migalhas de pão. De acordo com pesquisas, o movimento conta com apoio de cerca de 70% dos franceses. Não se sabe se a moratória colocará fim aos protestos ou se eles serão turbinados a partir da percepção de que o presidente, uma vez que tenha cedido nesta, pode recuar em outras medidas.