No caso dos lotações – ao contrário do que ocorre com os ônibus –, o preço da passagem é o menor dos problemas. Porque os usuários têm certo poder aquisitivo: em geral, conseguem pagar o valor da tarifa, que no mês passado subiu para R$ 8 em Porto Alegre. Qualquer viagem de Uber, mesmo que dure uma quadra, sai mais cara do que isso. E o lotação, em tese, tem boas vantagens.
Se você mora na Zona Sul, por exemplo, talvez tenha um lotação passando na esquina de casa. De lá, poderá se deslocar por longos 15 quilômetros, com conforto e sem maiores desvios de rota, pagando R$ 8. De Uber, gastaria o triplo. Em tese – repito, em tese –, vale a pena.
Mas, ainda assim, as pessoas preferem Uber. A própria Associação dos Transportadores de Passageiros por Lotação (ATL) reconhece que a concorrência dos aplicativos foi crucial para a decadência dos micro-ônibus – atualmente, são 6 milhões de passageiros por ano, número que atingiu 20 milhões em 2014, um ano antes da chegada da Uber.
Se o preço é aceitável e se as vantagens são evidentes, por que os lotações são tão rejeitados? Há uma série de fatores, mas um deles merece reflexão urgente: nenhum sistema de transporte vai se manter – independentemente do valor que cobrar – se não se adaptar aos novos tempos. Qual é a grande diferença dos lotações de hoje em comparação com 30 anos atrás? Nenhuma.
Porque hoje, você sabe, não adianta o lotação me pegar na esquina de casa sem me informar, por exemplo, que horas vai chegar. Não vou aguardá-lo indefinidamente. Também quero saber se ele virá lotado ou não, que trajeto vai fazer, quanto tempo levará até o meu destino. Do jeito que está, sem qualquer suporte tecnológico, é possível que exista um lotação passando atrás da minha casa e eu nem saiba. Mais fácil andar de Uber.
Quase todas as alternativas de transporte se renovaram nos últimos anos: a bicicleta ganhou mais ciclovias, os ônibus têm geolocalização, os táxis aceitam corridas pelo celular, o trensurb tem aplicativo próprio, mas o lotação ficou para trás. Uma pena, já que a cidade paga o pato – um micro-ônibus transportando 10 pessoas é bem melhor, para o trânsito e para o meio ambiente, do que um Uber para cada uma delas.
Mas assim são os novos tempos: ou a gente se adapta, ou nos atropelam.