Um vereador de Porto Alegre quer transformar o sanduíche aberto em patrimônio cultural imaterial da cidade. Esse tipo de projeto soa sempre meio estranho: que diferença vai fazer? Serve para quê? Quem ganha com isso?
A coluna, então, decidiu ouvir o autor da proposta, Adeli Sell (PT), e a professora que deu a ideia, Susana Gastal. Susana pesquisa cultura e cidade na Universidade de Caxias do Sul – recentemente, ela e duas colegas escreveram um artigo acadêmico sobre as origens do sanduíche aberto. A história é interessante.
Quando os alemães chegaram aqui, no século 19, as donas de casa costumavam fazer, para o almoço de domingo, um assado de lombo ou pernil de porco. Era a especialidade delas. À tardinha, na hora da janta, as mulheres eram liberadas de cozinhar: pegavam as sobras do almoço, desfiavam a carne, faziam uma base com pão preto e adicionavam ovos, pepino, tomate e o que mais tivesse.
Em vez de cobrir tudo com mais pão, como qualquer sanduíche, elas despejavam sobre a iguaria o molho que restara na fôrma onde o pernil havia sido assado. Surgia assim um dos acepipes mais populares de Porto Alegre.
– Mas, de uns tempos para cá, ele começou a sumir. Até o início dos anos 1990, era quase obrigatório um bar servir sanduíche aberto na Capital – diz a professora Susana, para depois alertar: – As cidades mais interessantes são as que preservam suas tradições.
Ao oficializar o quitute como patrimônio cultural, a ideia é torná-lo um prato-símbolo do município. Isso, em tese, facilitaria sua inserção em materiais turísticos, em cursos de culinária, em faculdades de gastronomia e, principalmente, em iniciativas que pudessem promovê-lo. O projeto de lei do vereador Adeli, por exemplo, sugere que o Executivo incentive festivais para escolher o melhor sanduíche aberto de Porto Alegre.
– A gente pode comer pão de queijo no mundo inteiro, mas nunca vai esquecer que ele é de Minas. Mesma coisa com o vatapá baiano. Mas talvez nem o porto-alegrense saiba que o sanduíche aberto é daqui – diz Adeli.
A professora Susana avalia que, seja para receber turistas ou investidores, uma cidade precisa de atrativos – e de uma boa oferta cultural:
– Qualquer visitante procura uma região com singularidades, com coisas novas.
Que uma delas seja, então, o nosso desprezado sanduíche aberto.