Referência no combate ao coronavírus, o Grupo Hospitalar Conceição liberou 19,2 mil comprimidos de hidroxicloroquina para os médicos prescreverem aos pacientes. Será a primeira instituição de Porto Alegre a distribuir o medicamento de graça, pelo SUS, para tratamento precoce de covid-19. A decisão provocou desconforto entre médicos do hospital que reprovam a prescrição do remédio.
Em comunicado enviado às equipes, a direção do GHC avisou que o paciente, ao receber a hidroxicloroquina, precisa assinar o Termo de Ciência e Consentimento. Esse documento ressalta que "não há, até o momento, estudos suficientes para garantir certeza de melhora clínica" com o medicamento – que pode provocar, segundo o texto, efeitos colaterais como "redução dos glóbulos brancos, disfunção do fígado, disfunção cardíaca e arritmias", além de "alterações visuais por danos na retina".
– Não estamos forçando ninguém a usar. Também não estamos fazendo uma orientação aos médicos. Se um paciente quiser tomar e o médico quiser receitar, nós temos (o medicamento) – diz o diretor-presidente do GHC, Cláudio Oliveira.
A hidroxicloroquina, segundo ele, estará disponível em consultórios do Hospital Conceição, da UPA Moacyr Scliar e dos 12 postos de saúde administrados pelo grupo. Ouvidos pela coluna, quatro médicos que trabalham no GHC disseram que uma instituição de excelência, como o Conceição, não poderia consentir com um tratamento sem comprovação científica. Por receio de represálias, nenhum deles aceitou se identificar.
– É claramente um movimento político, e não técnico – disse um dos médicos, lembrando que a cúpula do GHC é nomeada pelo Ministério da Saúde, que aconselha a prescrição de hidroxicloroquina a pedido do presidente Jair Bolsonaro.
Foi o próprio Ministério da Saúde que enviou os lotes do medicamento ao grupo hospitalar de Porto Alegre. A elaboração do protocolo para receitar o remédio foi liderada pelo infectologista Renato Cassol, coordenador do Controle de Infecção Hospitalar do Conceição. Nesse protocolo, também enviado às equipes, o tratamento precoce da covid-19 é recomendado em associação com azitromicina, um antibiótico ainda sem eficácia comprovada contra o coronavírus.
– Antes, o paciente só conseguia acesso à medicação no consultório privado. E precisava ter condições de comprar. Isso agora acabou, e a gente continua respeitando a autonomia do médico – afirma Cassol.