O vídeo que mostra pelo menos 10 cães amontoados em uma gaiola de metal, na Ilha dos Marinheiros, é no mínimo desagradável de assistir. Segundo grupos de proteção animal, trata-se de uma amostra dos maus-tratos que a prefeitura de Porto Alegre impõe a cachorros de rua.
– Enfiaram os bichos ali sem cuidado algum, sem o menor respeito. Eram funcionários de má vontade, reclamando, uma situação completamente horrível – conta a advogada Bruna de Lima Costa, 29 anos, voluntária do projeto SOS Animais da Ilha, que já resgatou 500 cães e gatos abandonados no bairro Arquipélago.
O vídeo foi gravado na tarde de 4 de junho, quando funcionários da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, a pedido de protetores, foram ao local recolher cachorros para castração. Depois que a última cadela é forçada a entrar na gaiola – instalada na caçamba de uma caminhonete –, uma mulher chega a gritar "coitada!" ao ouvir o gemido do animal.
Conforme Bruna, os bichos castrados foram devolvidos ao local no dia seguinte, sem terem recebido cuidados pós-operatórios – são recomendados, no mínimo, cinco dias de observação. A veterinária Luíza Fronckowiak, 23 anos, que atua como voluntária em outra região de Porto Alegre, tem um relato parecido.
– Os cães chegam a retornar para a rua no mesmo dia. Não recebem tratamento continuado com analgésico, anti-inflamatório e antibiótico, que são fundamentais para reduzir a dor e o risco de infecção – denuncia Luíza, que integra o grupo SOS Animais da Vila Nazaré, responsável pelo resgate de 250 animais na Zona Norte.
Procurada pela coluna, a secretária municipal adjunta do Meio Ambiente, Viviane Diogo, garantiu que, no caso do vídeo de 4 de junho, tratava-se de uma "situação emergencial". A van normalmente utilizada para transportar os cachorros, segundo ela, estava no Detran para regularização de documentos. Nessa van, segundo Viviane, os bichos costumam ser acomodados em várias caixas menores, próprias para esse tipo de transporte.
Avalio o trabalho dos profissionais como positivo. Eles têm experiência, sabem manusear animais com cuidado.
VIVIANE DIOGO
Secretária municipal adjunta do Meio Ambiente
– Como já tínhamos agendado o resgate, optamos por não cancelar a castração – diz Viviane, que avalia como "positivo" o trabalho dos funcionários: – Eles têm experiência, sabem manusear animais com cuidado.
Conforme a secretária, existe um "acordo verbal" com os protetores para que eles fiquem responsáveis pelos cuidados pós-operatórios dos cães. Mas os dois grupos consultados pela coluna afirmam não ter conhecimento disso.
– Se houvesse esse acordo, os cachorros deveriam ser entregues para nós, e não jogados de novo na rua – contesta a veterinária Luíza.
A Secretaria Municipal do Meio Ambiente enviou uma nota à coluna:
"Em abril deste ano, a Prefeitura de Porto Alegre publicou decreto exigindo de empreendimentos, onde é necessária a remoção de famílias, que na etapa de licenciamento ambiental seja incluído também projeto de resgate, controle populacional, ressocialização e adoção de animais domésticos.
A iniciativa, inédita no país, visa ampliar e assegurar a proteção dos animais e impedirá situações como as enfrentadas atualmente na Vila Nazaré, e na obra da nova ponte do Guaíba, na Ilha Grande dos Marinheiros, onde o município atua em parceria com a comunidade e com voluntários.
A Diretoria Geral dos Direitos Animais (DGDA) informa que o transporte de animais provenientes de ações em comunidades, até a Unidade de Saúde Animal Victória (Usav), ocorre preferencialmente em veículo fechado, tipo van, onde os animais são acomodados em caixas de transporte individuais ou gaiolas coletivas.
Em relação à situação específica, excepcionalmente, a condução dos animais à Usav não ocorreu no veículo utilizado para este fim, que se encontrava em ajustes para regularização de documentos junto ao Detran.
Nas ações junto às comunidades, a equipe da DGDA realiza a busca dos animais no dia anterior ao procedimento cirúrgico, como medida para garantir o jejum pré-operatório. Os animais são castrados na manhã seguinte e permanecem na USAV durante o dia, sendo observados até que estejam em condições de retornar aos seus tutores ou responsáveis, para os cuidados pós-operatórios.
Todas as ações são realizadas por uma equipe experiente, que atua no município, desde o início das atividades da extinta Seda. Encaminhamos, em anexo, fotos do veículo especialmente adaptado para este fim e obtido por recursos doados pelo Ministério Público."
Com Rossana Ruschel