Em primeiro lugar, aniversário é para falar bem. Não venha você, no meu aniversário, apontar defeitos no meu jeito, na minha aparência ou no modo como levo a vida. Pelo menos nesse dia, eu quero aplausos. Quero o paparico de quem me rodeia, o louvor às minhas virtudes e o silêncio sobre as minhas falhas.
Como colunista de Porto Alegre, falo mal de Porto Alegre com certa frequência. Mas, você sabe, tudo tem dois lados – e enxergar o lado mais agradável de qualquer coisa não deveria ser exclusividade de aniversários. Tenho tentado praticar esse exercício. Veja o viaduto da Borges, por exemplo.
Você pode olhar apenas a parte de baixo, escandalizar-se com tanta penúria, degradação e descaso, mas também pode – e precisa, acredite – observar o que ocorre em cima. Aliás, sugiro que hoje mesmo, na saída do trabalho, você convide duas ou três pessoas do seu agrado para celebrar, nos altos do viaduto, os 246 anos de Porto Alegre.
Eis um lugar que tem dado orgulho.
Você pede uma mesinha na rua, em um dos simpáticos bares que se esparramam nas escadarias, depois acompanha o sol se pondo e dando lugar à luz suave das luminárias antigas, então aprecia a imponência dos parapeitos, das colunas e das arcadas em estilo eclético, percebe o entusiasmo dos frequentadores que aproveitam a cidade ao ar livre e, por fim, se dá conta de que aquilo só existe aqui. É lindo, é único e é nosso.
O viaduto da Borges é um símbolo de Porto Alegre não só por isso, mas porque suas duas facetas – a de cima e a de baixo – resumem a dualidade que hoje marca a nossa capital. Não é saudável, não é nem humano, fechar os olhos para o abandono lá de baixo, mas é inspirador e estimulante enaltecer o que dá certo.
Sabemos que Porto Alegre emana desleixo, mas nunca a população se engajou tanto no bem-estar da cidade – além dos empreendedores que investiram no viaduto, a recente onda de revitalização de escadarias é um fenômeno sem precedentes no país. Também sabemos que a insegurança nos acossa, mas os eventos de rua vão ganhando estrutura, regras, novos debates e, com isso, tornam a cidade mais vibrante e protegida.
Verdade que merecemos mais, mas também é verdade que, em poucos meses, a relação do porto-alegrense com o Guaíba finalmente mudará de patamar com a entrega do primeiro trecho da orla. Porto Alegre tem valores, tem belezas e tem gente se empenhando para alegrá-la. No aniversário dela, façamos o que se faz em qualquer aniversário: vamos encher um pouco a bola da aniversariante.