Até recentemente, o quadro fixo mais suave dos jornais televisivos era o da previsão do tempo. Apresentadoras eficientes e elegantes, movimentando-se com desenvoltura em frente a mapas digitais bem elaborados, eram invariavelmente vistas pelos telespectadores como um lenitivo em meio ao noticiário árduo de desastres, crimes e falcatruas políticas. Não mais.
Virou um quadro de horrores. As moças do tempo estão transformadas em porta-vozes do desequilíbrio climático. Cada vez que uma delas entra em cena para falar de cavados, zonas de convergência ou outras estranhezas da terminologia meteorológica, o pobre telespectador ergue as sobrancelhas e exclama para si mesmo:
— Lá vem tragédia!
E tem vindo mesmo: seca e inundação neste Rio Grande de São Pedro e calorão interminável no país vizinho chamado Brasil. Os mapas mostrados pelas meninas do tempo realizam graficamente o polêmico separatismo farrapo: um Estado azul-esverdeado com raios e trovões, e os demais transformados em brasa.
Não é culpa delas, evidentemente. É nossa, dizem ambientalistas, cientistas e palpiteiros de todos os calibres. A gente assiste apavorado ao cataclismo diário e ainda fica com a sensação de culpa. Talvez tenhamos mesmo ajudado a enfurecer o tal El Niño, mas será que a culpa é só nossa?
No tempo de Noé, pelo que se sabe, não havia carros poluindo o planeta, nem desmatamentos. Ainda assim, segundo os relatos bíblicos, choveu durante 40 dias e 40 noites. Quase não houve sobreviventes. Trazendo para a realidade e para mais perto: nossa leal e valorosa cidade ficou inundada em 1941, quando tinha menos de 300 mil habitantes e a coleta de lixo devia ser bem mais eficiente do que a atual. Naquela ocasião, vale lembrar, o Estado inteiro também foi afetado pelas cheias, como agora.
Não sou negacionista. Aceito a tese de que as catástrofes climáticas estão se tornando mais frequentes por conta de desequilíbrios que devem ter mesmo as nossas impressões digitais. Nunca se viu tanto ciclone. A cada semana, tem um. Até por isso, os meteorologistas se tornaram mais cautelosos: é só aparecer uma nuvenzinha mais grossa e eles já avisam que o céu pode cair sobre nossas cabeças. E talvez tenha mesmo que ser assim: melhor alertar e não acontecer nada do que deixar a população ser surpreendida por tempestades destruidoras e mortais. É tanta intempérie que o quadro do tempo dos jornais televisivos virou um oráculo de maus presságios.