Li, encantado, a reportagem da colega Jéssica Weber sobre o roteiro assombrado pelo Centro Histórico de Porto Alegre, que reúne pontos turísticos, fatos e lendas urbanas da Capital. Duas estações do tour macabro me chamam especial atenção pelas referências literárias que evocam, protagonizadas por amigos queridos: o endereço do açougueiro da Rua do Arvoredo, episódio romanceado pelo historiador Décio Freitas no livro O Maior Crime da Terra, e o Castelinho do Alto da Bronze, também retratado no romance-reportagem A Prisioneira do Castelinho do Alto da Bronze, escrito pelo jornalista Juremir Machado da Silva.
Ambos os livros são reconstituições cuidadosas e documentadas de histórias reais que parecem mesmo ficção. Os crimes do serial killer que assassinou várias pessoas, supostamente para serem transformadas em linguiça, foram amplamente noticiados pelos jornais da época que acompanharam a investigação, a prisão e a condenação dos acusados. Décio consultou os periódicos, pesquisou o processo no Arquivo Histórico, recuperou registros policiais e descreveu detalhadamente os atos praticados pelos personagens. É evidente que também usou a imaginação para resgatar diálogos e situações que carecem de comprovação documental.
Talvez essa licença poética do historiador tenha contribuído para estimular a grande controvérsia em torno do tema: os mortos foram mesmo transformados em linguiça ou prevaleceu uma fantasia construída pelos contemporâneos para tornar o crime ainda mais hediondo? A verdade insofismável, registrada pelos jornais, é que a população ficou tão revoltada que chegou a enfrentar a polícia para tentar linchar os criminosos.
Já no relato sobre o Castelinho do Alto da Bronze há menos controvérsias, até mesmo porque os fatos são mais recentes e alguns personagens ainda transitam por aí. Trata-se, na verdade, de uma instigante reportagem de Juremir, que entrevistou a própria prisioneira do amor doentio e procurou registrar o necessário contraponto com a devida transparência. Como trabalhávamos juntos na época, acompanhei de perto o seu trabalho e tive a honra de escrever a orelha do livro.
Recomendo: faça o tour, leia os livros e conheça esses fantasmas vivos e mortos de Porto Alegre.