Sempre me divirto com aquela brincadeira apelidada de "separados ao nascer", que compara imagens de pessoas com semelhanças físicas, sem qualquer parentesco, por simples capricho da natureza. Há casos intrigantes de gente famosa, como o do ex-procurador-geral da República Roberto Gurgel e o humorista Jô Soares. Gurgel ficou indignado quando um advogado do mensalão destacou a similitude em meio a uma sessão do Supremo, mas, em outra ocasião, num restaurante, entrou no jogo do garçom e até encaminhou para outra cliente um autógrafo falso com a dedicatória do apresentador:
– Um beijão do gordo! – escreveu.
Fez bem. Fora do humor não há salvação.
Meus queridos amigos que já partiram para outra dimensão certamente também achariam graça se me vissem de olhos arregalados quando eventualmente cruzo por criaturas semelhantes a eles nas minhas caminhadas matinais. Outro diz avistei ao longe, vindo na minha direção, meu ex-companheiro de ofício Olyr Zavaschi, que nos deixou em 2011. Era ele: semicalvo, barba branca aparada na proporção do bigode, óculos de lentes largas. Olyr foi meu colega, amigo e mestre. Jornalista culto, ético e competente, quando editou o Almanaque Gaúcho cunhou uma resposta genial para os leitores que eventualmente registravam a repetição de alguma piada na página:
– Não existe piada velha. O que existe é gente velha que conhece a piada – dizia com a sua conhecida gentileza, provocando risos do interlocutor.
O Olyr reencarnado passou por mim como se não me visse. Não importa. Aquele desconhecido de traços tão conhecidos, sem desconfiar, deixou um perfume de saudade no calçadão.
Outro dia cruzei também com o inesquecível José Manosso, quase um irmão, que me acompanhou pelas Redações da vida, dos primeiros anos de Fabico na década de 70 até subir a sua Serra natal para sempre, em 2005. Grandalhão, desajeitado, cabelos compridos, óculos e barbicha stalinista, passou distraído pela outra calçada sem perceber que eu acompanhava sua passagem com os olhos marejados.
Amados fantasmas, voltem sempre!