Sei que o fato de ter antepassados açorianos é insuficiente para me absolver de possíveis acusações de xenofobia, mas resolvi me arriscar compartilhando algumas histórias curiosas que li sobre nossos patrícios d'além-mar. São tão inocentes, que até Renato Gaúcho poderia contá-las aos jogadores na preleção do jogo de hoje, para animar o grupo e provocar o treinador Jorge Jesus, com quem o ídolo gremista vem mantendo indisfarçável disputa de vaidade. Se o gajo quiser devolver na mesma moeda com piadas de "zucas" (que é a gíria empregada na península para ironizar os brazucas), ele que se entenda depois com seus comandados.
Elegemos os portugueses como vítimas preferenciais do nosso anedotário porque é assim que os povos colonizados costumam se vingar tardiamente dos colonizadores. É verdade que, às vezes, eles parecem mesmo um tanto ingênuos. Quando querem, porém, sabem ser espertos e irônicos. Esta primeira historinha real mostra bem como eles podem ser rápidos no gatilho. Certa vez, a apresentadora Hebe Camargo, entrevistando o humorista português Raul Solnado, perguntou-lhe se em Portugal também contavam piadas de brasileiro. Ele respondeu com outra pergunta, sarcástica e contundente:
– E precisa?
Muitas vezes, porém, brasileiros e portugueses dialogam em línguas diferentes. Ou exageramos no nosso modo figurado de falar ou, por pura implicância, eles fingem que não nos entendem. Veja-se, para exemplificar, esta deliciosa conversa publicada pelo BuzzFeed e creditada a Nina Paduani:
"Meus pais e meus tios estão em Lisboa. Vão ao restaurante almoçar. No final, o garçom pergunta:
– Café?
Meu pai:
– Um, por favor!
Meu tio:
– Dois!
Minha tia:
– Três!
Passam alguns minutos e lá vem o garçom.
Com seis cafés".
No mesmo site, tem a conhecida história de outro brasileiro que interrompeu a passagem de um cidadão em Lisboa e perguntou-lhe se sabia onde ficava o Castelo de São Jorge. O homem, solícito, respondeu:
– Sei.
E seguiu adiante em sua caminhada.
Disse que a historinha acima é manjada e me lembrei do saudoso colega Olyr Zavaschi, que editava a coluna Almanaque Gaúcho, hoje assinada pelo igualmente talentoso Ricardo Chaves. Toda vez que um leitor ligava para reclamar que a anedota da página era antiga, Olyr desarmava o crítico com uma brincadeira:
– Não existe piada velha. O que existe é gente velha que conhece a piada.
Pois os episódios aqui relatados demonstram que nem todas as histórias engraçadas sobre nossos irmãos lusitanos são anedotas. Muitas delas retratam a lógica linear dos portugueses, assim definida pelo jornalista e cronista Rui Carvalho, que exemplifica com o relato sobre a comissária de bordo da TAP. Ela pergunta ao passageiro se ele aceita jantar e o homem, distraído, responde:
– Quais são as opções?
A moça nem hesita:
– Sim ou não.
Rui Carvalho, que nasceu em Portugal e vive no Brasil, inclui em seu texto este primor da autoironia luso-brazuca:
– Qualquer um com um pouco de cultura sabe que piada de português não existe... É tudo verdade.