Do jeito que os grandes líderes do planeta utilizam as redes sociais para tudo, o corretor ortográfico ainda vai provocar uma catástrofe mundial. Na planície, esse intrometido recurso digital tem feito estragos. Quando não provoca risos, provoca mal-entendidos e desconfianças que nem sempre se desfazem com a correção da correção – isso quando essa tentativa de consertar não resulta em dano ainda mais grave.
Outro dia eu conversava amistosamente com uma amiga, fiz uma observação inocente sobre um tema de interesse comum e ela me devolveu:
– Chato!
Apressei-me em reler o que havia escrito. Não havia nada errado. Quando já me preparava para teclar um pedido de explicação, ela se antecipou:
– Claro*! Eu quis escrever "claro". Maldito corretor.
Entendi perfeitamente, pois também já caí nessa armadilha. Às vezes nem é o algoritmo que apronta. São os nossos dedos e a nossa urgência em enviar a mensagem antes da necessária revisão. No caso deste diálogo que pesquei numa página de curiosidades da internet, nem dá para saber se o responsável pela gafe foi o corretor ou a pressa. O rapaz pergunta à moça:
– Vem aqui em casa amanhã?
Ela responde:
– Nem vai dar. Amanhã vou estar no cio.
Rápido no gatilho, o jovem digita:
– Melhor ainda!
– No Rio*. No Rio de Janeiro. Idiota!
E dê-lhe asteriscos. O corretor ortográfico, que de vez em quando se intromete também na sintaxe, valorizou o asterisco no teclado. Mesmo digitadores cuidadosos passam dificuldade para vencer as resistências do sabichão, que muitas vezes simplesmente se recusa a aceitar frases menos convencionais. Li outro dia a queixa de um professor de português que tentou escrever "a falta que fazem as aulas...". O corretor tratou de botar no plural o que lhe parecia ser o sujeito da oração: "a(s) falta(s)".
Que Deus elimine os mal-entendidos antes que o pior ocorra.
Errrrou! – como diria o Faustão.
Aliás, gente famosa também se atrapalha. A modelo Ana Hickmann foi legendar uma foto do filho no Instagram e saiu o seguinte por conta da intervenção não solicitada do corretor:
– A mamãe está comunista saudade.
Era para ser, evidentemente, "com muita" saudade. Nestes tempos paranoicos de ideologização desenfreada, a gaúcha correu sérios riscos.
Há também os equívocos recorrentes, na maioria das vezes resultantes de mensagens bem-intencionadas, como o clássico "Que Deus te elimine!".
– Ilumine*. Ilumine*.
Que Deus elimine os mal-entendidos antes que o pior ocorra. Há poucos dias, Donald Trump tuitou uma letra a mais numa postagem e chamou o príncipe Charles de "príncipe das baleias", Whales, em vez do termo correto para Wales, região do sudoeste da Inglaterra. Como se trata de um aliado incondicional, o norte-americano nem precisou se corrigir. Imaginem, porém, se ele comete uma dessas com Putin, com o baixinho da Coreia do Norte ou com o aiatolá iraniano. Nem mil asteriscos evitariam um conflito.
Governantes poderosos deveriam ser impedidos de usar smartphones.