Achei bem original e criativo aquele casamento coletivo no cemitério Saint Hilaire, em Viamão, protagonizado por 10 casais destemidos no último final de semana. Sei que muita gente torceu o nariz, alegando que foi um lance de marketing, que os noivos queriam apenas aparecer e que a escolha do local inusitado para a cerimônia seria um desrespeito aos mortos. Ora, certamente nenhum dos inquilinos reclamou. Além disso, é absolutamente normal que os nubentes queiram mesmo deixar marcado com fotos, vídeos e o máximo de publicidade esse momento tão especial de suas vidas.
Muitos fazem isso. Tem gente que se casa aos pés do Cristo Redentor, em estádio de futebol lotado, no cinema, durante salto de paraquedas e até nas profundezas do mar. Claro, ainda é maior o número de pessoas que escolhem os palcos tradicionais, o altar da igreja, o cartório e os salões de clubes sociais. Mas praticamente todos selam o contrato público com uma frase do orientador ecumênico que não poderia ser mais apropriada para o local escolhido pelos personagens deste comentário:
– Até que a morte vos separe...
Pois então que, até lá, sejam todos felizes.
***
Um pedreiro da periferia de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, transformou o seu carrinho de mão em berço para o filho recém-nascido – por falta de recursos para comprar o leito adequado.
– A gente limpou, colocou as cobertinhas e agora ele dorme lá. Antes, a gente dormia na mesma cama e levantava a toda hora com medo de machucá-lo – explicou o homem.
A mãe da criança contou ao jornalista que divulgou a notícia que seu marido até parou de carregar cimento no carrinho e foi trabalhar com reciclagem de lixo. Alguns leitores se comoveram com o episódio, mas outros aproveitaram para jogar as pedras de sempre:
– Se não podem, por que botar mais uma criança no mundo?
– Estão se fazendo de vítimas. Vão trabalhar.
Compaixão parece mesmo ser uma mercadoria rara nos tempos atuais.
***
O que consola é saber que podemos ver a vida (e também a morte) com um olhar mais humano, compreensivo e respeitoso. Não gosto muito da palavra tolerância, pois denota superioridade de quem tolera. Prefiro empatia, colocar-se no lugar do outro. Aceitação e reciprocidade mudam o mundo. Gestos aparentemente insignificantes, como um cumprimento, um sorriso, uma visita, uma gentileza, uma escuta atenciosa, podem fazer toda a diferença no relacionamento. Como ensina o hermano Papa, o amor e a compaixão são mais fortes do que a morte.
Casamento no cemitério? Tudo bem, se os vivos se sentem confortáveis. Bebê dormindo em carrinho de mão? Compreensível para a situação, mas tudo mal. Toda criança merece um berço digno para os primeiros sonos da existência. Tenho certeza de que, apesar de um ou outro comentário mal-humorado, muito em breve o menino de Campo Grande receberá uma cama mais macia e adequada para os seus sonhos infantis.