Cada vez que vejo o Papa fazendo uma pregação pela paz mundial, como acontece sempre que conflitos bélicos e outras atrocidades chocam a humanidade, não consigo evitar um pensamento de pesar e descrença:
– Inútil!
Os governantes mundiais não dão a mínima para o Papa. Professem ou não a mesma crença do pontífice católico, eles estão mais preocupados em se manter no poder e em esmagar seus inimigos políticos. É arma química de um lado, é míssil teleguiado de outro.
Vem de longe essa desconsideração:
– Quantas divisões tem o Papa? – teria perguntado o ditador soviético Josef Stalin ao saber que o Vaticano reprovava suas ações.
Os atuais nem sequer ironizam. Não ligam para a ONU, por que iriam se preocupar com o Papa?
Mas tem gente que se preocupa. O papa Francisco, por sua franqueza e sensatez, já me fizera revisar antigos preconceitos contra argentinos que se julgam gênios da lâmpada e esquecem parentes nos postos de combustíveis. Agora me ganhou pela emoção.
No último domingo, durante uma audiência pública na periferia de Roma, ele respondia às perguntas de fiéis quando um menino de oito anos, Emanuele, assumiu o microfone. E não conseguiu falar, pois chorava convulsivamente. Então, o Papa pediu que ele se aproximasse e fizesse a pergunta no seu ouvido.
O garoto queria saber se seu pai, que era ateu e tinha morrido alguns meses antes, estava no céu.
Francisco não deu uma resposta piedosa nem enganosa. Pediu permissão para compartilhar a dúvida com o público. Autorizado, disse que só Deus poderia decidir quem merece o céu, mas que não tinha dúvida de que o pai do menino, pelo que ele acabara de lhe contar, era um homem bom. O garoto revelara que, embora descrente, o pai incentivara os filhos a fazerem suas próprias escolhas e, inclusive, aceitara que se batizassem. Ao ouvir isso, Francisco dirigiu-se ao público e perguntou:
– Deus abandona seus filhos quando são bons?
O "não" soou forte. E então o Papa disse ao jovenzinho:
– Bom, Emanuele, essa é a resposta. Deus seguramente está orgulhoso de seu pai, porque é mais fácil batizar os filhos sendo crente do que batizá-los não sendo crente.
Eis aí um homem sábio. Nem sempre concordo com as opiniões do Papa, mas ele tem o dom de me fazer refletir. Tanto que a partir de agora deixarei de rotular como inúteis suas pregações no deserto, para usarmos uma metáfora bíblica. Talvez os governantes mundiais continuem surdos a elas. Mas Emanuele, que também se chama futuro e um dia poderá até comandar uma nação, já não se preocupa com o destino eterno do pai ateu.
Ele aprendeu que as pessoas não são melhores ou piores por pensar diferente, por ter ou não ter uma religião, por ser descrente ou papa.
E que os conflitos humanos devem ser resolvidos com palavras – e não com mísseis.