Bastaram 45 minutos para que a Conmebol se convencesse de que o melhor jogador em campo na decisão da Libertadores foi Arthur, 21 anos, segundo volante do Grêmio. Não faltavam candidatos na extraordinária atuação gremista para chegar ao tricampeonato. Fernandinho e Luan, por exemplo, poderiam ter sido votados e não seria nenhum absurdo. Mas o primeiro tempo de atuação exuberante de Arthur foi suficiente.
Ele não resistiu 10 minutos no segundo tempo, as dores venceram sua persistência. Tinha sofrido uma pancada que lhe rendeu um entorse no tornozelo no último lance do primeiro tempo. Antes, desde o apito inicial do árbitro paraguaio, o goiano torcedor do Goiás que saiu de lá para a base do Grêmio tinha colocado o jogo no bolso. Arthur não errou passe, não errou drible, não errou nada. É quem faz a roda girar no meio-campo. Dita o ritmo, dá a dinâmica.
Aqui mesmo em Zero Hora, meses atrás, relatei uma conversa minha com Jorge Machado, o empresário do Arthur. Estávamos hospedados no mesmo hotel na Barra da Tijuca, falamos rapidamente. Machado me disse que já tinha proposta pelo jogador para a janela passada, mas decidiu, com a família, que não era hora de Arthur sair. Ao mesmo tempo, garantiu o empresário, seria impossível segurar Arthur na janela do início do ano - meio de temporada europeia - , especialmente se ele estivesse com faixa de campeão no peito.
No dia do jogo Lanús x Grêmio, eu tinha acabado de participar do Globo Esporte no saguão do hotel em que a delegação se hospedou em Buenos Aires quando fui abordado pelo pai do Arthur. Aílton de Paula Melo, 53 anos de idade, veio me agradecer por eu ter sido, segundo ele, o primeiro jornalista a destacar o futebol do seu filho.
De fato, eu estava na transmissão da RBSTV em São Paulo x Grêmio, em Rio Grande, quando o volante de passe certeiro me chamou a atenção naquele time reserva que perdeu por 1 a 0. Fiz o registro e passei a prestar atenção no meio-campista que me pareceu considerar o passe um patrimônio a ser preservado. Enfim, fiquei com o telefone do Aílton e liguei para ele um dia depois do título da Libertadores.
Dono de uma confecção de roupas e de uma loja em Goiânia, onde mora, o pai do Arthur estava em Porto Alegre no apartamento do filho quando conversamos longamente. Os principais tópicos desta conversa você passa a ler a partir de agora.
Aílton, você jogava bola?
Muito. No futebol amador em Goiás, eu era um dos quatro caras contratados do time que representava a cidade de Varjão, a 60 quilômetros de Goiânia. Jogava mais adiantado do que o Arthur, mas era parecido com ele. Aliás, ele é que aprendeu comigo. Bola no chão, passe, drible...sempre fui muito fã do Zico, adoro ver o Barcelona jogar, gosto de futebol bonito. O Arthur, aos quatro anos, me acompanhava nestes jogos de futebol de campo e no futebol-7 também. O Arthur levava a bola dele e ficava chutando contra uma parede enquanto eu jogava.
Quando o Arthur decidiu ser jogador de futebol profissional? Você nunca quis?
Eu nunca pensei em jogar profissionalmente, não. O Arthur chamou a atenção do Goiás quando tinha sete anos e atuava numa escolinha da cidade entre meninos mais velhos. O Goiás fez o convite para que ele entrasse na escolinha do clube, foi o que aconteceu. Quando enfrentava meninos da sua idade, Arthur jogava na meia. Entre os maiores, os meninos de 10 anos, por exemplo, virava volante.
Arthur jogava futebol com você nas brincadeiras da família?
Eu tinha um sítio com um campo perto de Goiânia. Com 12 anos, Arthur jogava entre os adultos. Quando eu fazia gol, dizia para ele: aprende comigo. Arthur respondia: minha hora vai chegar. Se não marcassem o Arthur de perto aos 12 anos, ele passava por todo mundo como se fosse gente grande. Até hoje falo com ele de futebol, ligo todos os dias, a conversa é mais longa em dia de jogo. Digo para ele: Arthur, arrisca mais, tenta a jogada pessoal, chuta, entra na área dos caras. Ele responde: "pai, não é sempre que dá, tem que ir na boa". Peço que ele não tenha medo de errar, tente, se não der tente de novo. Confiança é tudo.
O que você falou com Arthur antes do segundo jogo das finais?
Eu estava com receio do jogo, resultado apertado na ida, aquele pênalti não marcado no fim do jogo da Arena... Aí, no dia do jogo, perguntei de manhã no hotel olhando no olho dele: filho, tá confiante para hoje? Ele me respondeu bem assim: "Pai, hoje ninguém tira este título da gente." Fiquei tranquilo quando vi aquela confiança toda nele e depois no time inteiro.
O que é o Grêmio na vida do Arthur?
Eu torcia para o Goiás, mas virei gremista e nunca vou deixar de ser gremista, mesmo quando o Arthur sair para realizar o sonho de jogar num clube grande europeu. O tratamento da torcida do Grêmio comigo e com o Arthur me comove, que torcida...Somos e sempre fomos muito bem tratados no clube, não tinha como não virar gremista.
Você me disse que gosta de ver o Barcelona jogar. Vai ver muito em 2018, então?
Será? (risos). Três pessoas representando o Barcelona falaram comigo depois do primeiro jogo das finais. Disseram para mim que tinham vindo observar o Arthur de perto, que gostaram da atuação dele e que, se tudo desse certo, em breve o Arthur estaria jogando no Barcelona. Foi o único contato que tive com representantes do Barcelona até hoje. Se gostaram do que viram no jogo da Arena, quando o Lanús até foi melhor do que o Grêmio no primeiro tempo, imagina o que não gostaram quando viram a atuação do Arthur na Argentina!
Você está preocupado com a lesão dele para o Mundial?
Um pecado, ele estava na Arena na festa, e o tornozelo dele inchado, inchado...!!!! Ainda tentou voltar para o segundo tempo lá na Argentina, você viu? Voltou mancando e tudo.
Arthur sendo observado pelo Barça e provavelmente enfrentando o Real Madrid numa final de Mundial, o que lhe parece?
O Arthur é de gelo, cresce nas partidas mais difíceis. Tenho certeza de que, se o Grêmio for para a final contra o Real Madrid, o Arthur vai jogar mais do que jogou na Argentina contra o Lanús; Afinal, de contas, ele aprendeu tudo comigo (risos).