Os limites da América já não comportam mais o tamanho do Grêmio. Neste mágico 29 de novembro, data que ingressa para sempre na história do clube como uma de suas páginas mais gloriosas, a qualidade do time treinado por Renato Portaluppi luziu de forma tão intensa que fez desaparecer todos os artifícios extracampo ardilosamente criados pelo Lanús.
O tricampeonato da Libertadores veio com uma vitória por 2 a 1, que até poderia ser mais ampla. Renato, único brasileiro campeão continental como jogador e técnico, agora já merece uma estátua.
— Nunca tinha visto uma situação de tamanha tensão e animosidade. Uma recepção extremamente hostil e complicada, além de toda a desconfiança que paira em relação à arbitragem — reclamou, antes do jogo, o diretor jurídico Nestor Hein.
As palavras do dirigente sintetizavam uma situação de constrangimento que havia sido armada para tirar a concentração da equipe gaúcha. Apedrejamento aos ônibus que levavam os torcedores, proibição dos dirigentes de caminhar no gramado, luzes apagadas durante o aquecimento dos jogadores foram alguns dos episódios registrados no alçapão de La Fortaleza, um estádio infinitamente menor do que a decisão.
Uma estratégia que só resistiu até os primeiros minutos do jogo, quando a marcação alta do Grêmio, que funcionava até mesmo em cobranças de tiros de meta, mostrou quem mandaria em campo. Não por acaso Renato havia dito que o Grêmio não era o River Plate, vitimado na semifinal pelo Lanús. Arthur, com personalidade, conduzia o time à frente. Nos raros instantes de assédio argentino, sobressaíam-se Geromel e Bressan, que afasta de vez a desconfiança da torcida. Desconsolado, o técnico Jorge Almirón, que havia previsto facilidades na final, via ruir sua previsão.
A construção do tri teve início em janeiro. Na véspera do início da pré-temporada, Fernandinho hesitava em retornar ao Grêmio. Fosse sua a decisão, permaneceria no Flamengo, onde havia atuado por empréstimo no ano anterior. Renato, então, com a força de sua argumentação, convenceu-o o atacante a retornar, ainda que sem prometer-lhe a titularidade.
Aos 26 minutos do primeiro tempo, após Marcelo Grohe afastar para longe da área uma falta cobrada pelo Lanús, Fernandinho tirou proveito de um erro grosseiro de Gómez, disparou da intermediária rumo ao campo argentino e antes que o goleiro Andrada tivesse tempo para preparar a defesa, fulminou-o com a potência de seu chute, que fez a alegria da torcida inundar todos os recantos onde havia alguém vestido com a camisa do Grêmio.
E o que dizer do gol de Luan, que entra na galeria de obras de arte construídas de um campo de futebol? A 41 minutos, o atacante avançou em diagonal, ingressou na área diante de atordoados marcadores e com um sutil toque humilhou Andrada e abriu as portas para a festa definitiva.
Sand, a 42 minutos, na frente de Grohe, bateu para fora e desperdiçou a única oportunidade do Lanús na primeira etapa.
O cansaço de Arthur, que o fez ser substituído por Michel, tirando a capacidade de criação da equipe, havia sido o único contratempo do Grêmio até o pênalti cometido por Jailson sobre Acosta. Na cobrança, Sand deslocou Marcelo Grohe e diminuiu a diferença, fazendo a torcida vibrar pela única vez.
Por cautela, trocou Lucas Barrios por Cícero. Era preciso conter a tentativa de reação argentina, que vinha basicamente em arremates de longa distância, alguns perigosos, como o de Marcone.
Houve momentos de tensão nos minutos finais, dentro de campo, com a expulsão de Ramiro, e fora, com objetos jogados por irados torcedores do Lanús contra o camarote onde se acomodavam alguns convidados do Grêmio. Mas nada que assustasse ou alterasse o panorama. Pelo contrário, Luan por muito pouco não fez o terceiro, em outra pintura.
A celebração, que lotou a Arena e a avenida Goethe, irá se estender ainda por muitos dias. Quem ostenta um título de tri da América merece.