Eduardo Secchi, pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da Universidade Federal de Rio Grande (Furg), é parte da equipe que assina dois estudos ambientais de empresas que querem fazer pesquisas sísmicas — base para a avaliação do potencial exploratório de petróleo e gás — na Bacia de Pelotas. Nesta entrevista à coluna, conta como a universidade que tem "vocação" oceanográfica se prepara para "ir a campo" já no próximo ano, além da expectativa em torno de investimentos.
Quando a Furg começou a pesquisar a Bacia de Pelotas?
A Furg estuda a Bacia de Pelotas, independentemente do interesse da indústria de óleo e gás, desde a década de 1970, com estudos sobre o potencial pesqueiro da região e outros de interesse de pesquisa ecológica da própria universidade. Quando surgiu o interesse mais recente pela exploração de óleo e gás, começamos a construir projetos com visão mais focada em conservação ambiental perante as atividades de prospecção e exploração de óleo e gás.
Desde quando a Furg pesquisa a Bacia de Pelotas?
Tivemos projetos com outras empresas de óleo e gás, como a Chevron, que nos procurou para fazer um estudo de caracterização ambiental, avaliando áreas de significância biológica e ecológica para a biodiversidade marinha. Não abrimos mão, em qualquer contato com empresas, de que, se eventualmente houver exploração de óleo e gás, tenhamos bem mapeados os locais de maior sensibilidade ambiental para poder orientar a tomada de decisão.
O estudo para a Chevron foi na Bacia de Pelotas?
Não, foi no Sudeste, nas bacias de Campos e de Santos. Mas, como existe conexão, fizemos uma proposta que incluía a Bacia de Pelotas. Nossa amostra de dados foi do Chuí até Cabo Frio (Rio de Janeiro). Começou com a Chevron, depois foi assumido pela Prio (antiga PetroRio). Durante os últimos 14 anos, fizemos cinco cruzeiros de primavera, cinco de outono, dois de verão e dois de inverno.
Como são esses cruzeiros?
A biodiversidade não tem padrão de distribuição porque é influenciada pelas características ambientais, que não são estáveis. Fazíamos cruzeiros oceanográficos, saídas de campo com navio de pesquisa oceanográfica, fazendo zigue-zague. Nas pontas das linhas, fazíamos estações oceanográficas, com equipamentos para verificar características da água, como salinidade, temperatura e nutrientes. O navio tem equipamento acústico que detecta cardumes. Durante o trajeto, observávamos aves, baleias e golfinhos. O cruzeiro oceanográfico coleta informações sobre as características físico-químicas da água e a biota (conjunto dos seres vivos) da área.
E como avança o estudo com a TGS, que planeja começar sísmica 3D da Bacia de Pelotas em 2025?
Foi aberto um processo no Ibama e, se aprovado, vamos executar o estudo. Um foco que o termo de referência do Ibama pede é ver se a sísmica pode ter algum efeito nos mamíferos marinhos e nas tartarugas. Teríamos de fazer, nesse caso, uma telemetria, além do estudo oceanográfico. Colocaríamos transmissores em tartarugas e baleias para ver se há áreas de maior ou menor potencial impacto da atividade sísmica. A empresa tem essa preocupação de buscar universidade que tem histórico de oceanografia. A Furg é uma referência nas pesquisas oceanográficas, é a vocação universidade.
Outras empresas procuraram a Furg?
Teve outra, a PGS. Preparamos proposta para a região norte da Bacia de Pelotas, na divisa de SC e RS. É um estudo ambiental parecido com o que fizemos para a TGS.
Como a Furg se planeja para atender ao interesse em explorar a Bacia de Pelotas?
Queremos usar toda a informação gerada para formar alunos, da iniciação científica ao pós-doutorado. O papel da universidade é usar a informação científica coletada no mar para facilitar a tomada de decisão, com a maior responsabilidade ambiental possível. Esperamos que as empresas que venham explorar invistam em pesquisa de desenvolvimento e inovação. Esperamos que parte desse investimento seja para a universidade, para avançar e aumentar a capacidade acadêmica e científica da região.
Nessa etapa mais focada, quando a Furg planeja ir ao mar?
Não depende da nossa vontade. Os projetos que entraram no Ibama estão em análise e deve haver decisão no início do próximo ano. Se forem aprovados, estamos preparados para ir ao mar logo depois, ainda no início de 2025. O navio acabou de chegar do último cruzeiro de inverno. Agora, vai para o estaleiro, fica até início do próximo ano, no máximo, e já estará pronto para uso.
Quais são as preocupações ambientais na fase de estudos sísmicos?
As espécies de golfinhos se comunicam com sons embaixo d'água. A sísmica pode afetar o ouvido desses animais, dependendo de sua proximidade com a atividade. Pode ter efeito em baleias. Então, identificar as épocas de menor abundância desses animais é uma parte do estudo. Outra, com mais detalhamento, é identificar, entre as espécies de maior frequência, quais as áreas preferenciais e qual é a sobreposição com a área de interesse da sísmica. Com mapeamento bem detalhado, podemos orientar que a sísmica seja feita em certos locais e momentos, baseados na dinâmica de ocupação dos animais.
*Colaborou João Pedro Cecchini