O pior agosto desde 2019 do ponto de vista das queimadas na Amazônia trouxe de volta o debate sobre o "ponto de não retorno" da floresta. Isso quer dizer que, a partir de determinado nível de destruição, o bioma será extinto.
Sim: termina, morre, é eliminado. E não se trata, como o cenário do oceano no lugar do Guaíba, de uma projeção de milênios. Em seu lugar, em pouco mais de 25 anos pode estar uma savana: algo parecido com o Cerrado no Planalto Central do Brasil.
Em entrevista à coluna em 2022, o climatologista Carlos Nobre havia exposto o tema:
— Se a gente perder a Amazônia, perde os rios voadores, o que vai diminuir a chuva no inverno no Sul. O transporte de água para o Sul cairia entre 20% e 30%.
"Rios voadores" é o nome poético do fenômeno meteorológico que traz chuva da Amazônia para o sul do país - e também a fumaça das queimadas. Não é uma teoria: o corredor é mostrado em imagens de satélites, tanto no caso da chuva quando no da fumaça, basta ver acima.
Antes de prosseguir, é bom lembrar que Carlos Nobre, apesar de tudo o que já viu e predisse, define-se como "otimista". Outros pesquisadores discutem, a sério, se a floresta amazônica já não atingiu essa ponto de não retorno, ao menos no sul da Amazônia, área mais desmatada.
Conforme Beto Veríssimo, cofundador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), esse ponto de ruptura é calculado em 30% por cientistas que trabalham com modelagem climática. Isso significa que se o desmatamento avançar até esse ponto, mesmo que seja zerado a partir desse momento, "a floresta vai entrar em um processo irreversível de destruição".
Segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Ambientais (Cemaden), neste ano 59% do Brasil está com algum grau de seca. Não é coincidência que isso ocorra enquanto o desmatamento amazônico prossegue, como explicou Carlos Nobre:
— A estação seca está de três a quatro semanas mais longa nos últimos 40 anos. No sul da Amazônia, em uma área de 2 milhões de km2, há aumento da mortalidade de árvores típicas de clima úmido. A estação seca, que era curta e com alguma chuva, está de 2ºC a 3ºC mais quente. Antes, isso ocorria quando havia El Niño, a cada 15 ou 20 anos. No intervalo, a floresta se recompunha.
Não existe atividade econômica que esteja blindada a esse grau de risco.