Definidos só tarde da noite de terça-feira (30), os cortes de R$ 15 bilhões confirmaram as linhas gerais antecipadas pela equipe econômica, mas também embutiram um sinal importante ao ter entre as maiores fatias de contenção os ministérios da Saúde e o da Educação.
Nos longos 15 dias de espera entre o anúncio do valor e seu detalhamento, houve todo tipo de especulação, inclusive de que essas duas áreas seriam poupadas da tesourada.
Não fazia sentido, tanto pela nova situação dessas duas áreas sob o novo arcabouço fiscal quanto por declarações recentes do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O corte na Saúde corresponde a 9,39% da dotação de R$ 46,96 bilhões, enquanto o na Educação representa 3,75% da previsão de R$ 34,15 bilhões.
Na troca do teto de gastos pelo arcabouço fiscal, houve revinculação das despesas com saúde e educação à receita, considerada uma distorção. Como o governo optou por fazer ajuste pelo lado da arrecadação, as dotações dessas duas áreas subiram muito e criaram um problema que fez Haddad afirmar, há uma semana:
— Algumas pessoas têm dito que, se as regras atuais de vinculação não forem alteradas, mesmo que se considere o teto de 2,5% do PIB, essas despesas vão acabar comprimindo as despesas discricionárias em função da obrigatoriedade. Esse é um debate legitimo, que está sendo feito também pelo governo federal.
Do total, como deixou claro o comunicado, R$ 11,2 bilhões serão cortados definitivamente, enquanto existe chance de retomar ao menos parte dos R$ 3,8 bilhões contingenciados:
"O bloqueio, que leva ao cancelamento de despesas discricionárias para o atendimento de despesas obrigatórias, ocorre para que se cumpra o limite de R$ 2,116 trilhões fixado para a despesa primária neste ano. O contingenciamento limita o empenho e a movimentação financeira das despesas e tem como objetivo evitar que o déficit primário fique acima de R$ 28,8 bilhões."
Em tempo: não havia risco de corte da ajuda federal para o Rio Grande do Sul porque a maior parte dos recursos vem de crédito extraordinário aprovado pelo Congresso. Isso significa que esse gasto não conta para o cumprimento da meta fiscal nem no limite de despesas. É por isso que os especialistas em contas públicas excetuam o socorro ao Estado da meta fiscal. Se contasse, a expectativa seria um déficit de 0,7%. Como não conta, é de 0,5%.
Os maiores cortes
- Saúde | R$ 4,4 bilhões
- Cidades | R$ 2,1 bilhões
- Transportes | R$ 1,5 bilhão
- Educação | R$ 1,3 bilhão
- Desenvolvimento Social | R$ 924,1 milhões
Os menores cortes
- Gabinete da Vice-Presidência | R$ 100 mil
- Agência de Transportes Aquaviários | R$ 1,3 milhão
- Ministério do Empreendedorismo | R$ 1,9 milhão
- Conselho Adm. de Defesa Econômica | R$ 2,1 milhões
- Agência Nacional de Aviação Civil | R$ 2,4 milhões
O que chamou atenção
- O gabinete da Presidência da República não escapou dos cortes: a contribuição de R$ 137,8 milhões na contenção de gastos tem um dos mais altos percentuais, de 10,6%.
- O Banco Central, que segue alvo de ataques verbais do presidente e de aliados, teve o sexto menor corte, de R$ 2,9 milhões.
- O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima escapou dos cortes. Nem um centavo foi alvo de bloqueio ou contingenciamento. É bom lembrar que sua dotação anual é de R$ 1,3 bilhão, pálida ante as dotações de Saúde e Educação.
Lembre da diferença
R$ 3,8 bilhões contingenciados: o objetivo é cumprir a meta fiscal anual de déficit zero, com intervalo de tolerância de 0,25% do PIB, para cima ou para baixo. Esse tipo de restrição é reversível, ou seja, caso haja resultado melhor do que o previsto, pode voltar a ser liberado.
R$ 11,2 bilhões bloqueados: é uma exigência para o cumprimento do limite de despesas definido no arcabouço fiscal, que prevê aumento máximo de 2,5% ao ano, descontada a inflação. Esse é um corte bem mais difícil de reverter, embora não seja impossível.