De volta ao Estado depois de participar da 8ª edição do Fórum Europeu de Defesa Civil, Abner de Freitas, CEO da startup gaúcha Hopeful, que trabalha com prevenção de desastres, relata episódios em países e regiões que podem servir de exemplo ao RS no enfrentamento de novas inundações. Da Itália a Santa Catarina, segundo o empreendedor, a melhor resposta à próxima catástrofe é investir em Defesa Civil, sobretudo em ações de preparação, para evitar as emergenciais.
O que outros países podem ensinar ao Rio Grande do Sul em prevenção de desastres?
No final do ano passado e no início deste ano, estivemos três meses na Itália, em três regiões diferentes, aprendendo sobre gestão de desastres em Defesa Civil. Na década de 1970, houve um grande desastre no Norte. Não faltou solidariedade, mas a população estava desorganizada. Desde então, a Defesa Civil da Itália incentiva a gestão de voluntariado. Roma trabalha com 84 grupos treinados. Visitamos também a Albânia, que sofre com terremotos. Está na constituição que 4% do PIB deve ser destinado à Defesa Civil. Existem exemplos negativos também, como na região de L'Aquila, na Itália, que sofreu com terremoto em 2009. Houve um esquema de corrupção na cidade que retardou a reconstrução.
Quais são as ações discutidas no fórum?
Uma das lições é a caracterização dos desastres no contexto da mudança climática. O Fórum Europeu diz que são complexos, com multirriscos, transfronteiriços e intersetoriais. É o que estamos vivendo no Rio Grande do Sul. Tive a oportunidade de apresentar o caso do Estado para diretora de prevenção e preparação em desastres da Comissão Europeia, que ficou impressionada. Outra questão relevante é o gerenciamento de voluntariado espontâneo. Muitas vezes, caímos no lugar comum de dizer que a má gestão ou a falta de organização do voluntariado é um problema dos brasileiros. Mas outros países também lidam com isso. Foi um desafio também observado em outros três países: Alemanha, Eslovênia e Croácia, em regiões com característica de inundação. A Alemanha emitiu um relatório orientando como os municípios devem lidar com o voluntariado espontâneo
O que foi discutido, mas ainda não aplicamos no Estado?
Não há discussão no Estado sobre possíveis reformas na Defesa Civil para preparar e fortalecer a prevenção do próximo desastre. Existe uma distopia econômica em que a sociedade remunera a reparação dos danos, mas não a prevenção. Sempre deixamos a Defesa Civil de lado, sem investimento.
O que pode servir de inspiração?
Aqui do lado, Santa Catarina. Quando Santa Catarina passou pelo desastre de Itajaí, Ilhota, Balneário Camboriú, fez uma reforma na Defesa Civil, que hoje é referência. Tem um departamento com pesquisadores para cada categoria de desastre. Só vi isso na Itália. Se não mudarmos a Defesa Civil, teremos a mesma resposta no próximo desastre.
Se não mudarmos a Defesa Civil, teremos a mesma resposta no próximo desastre
Quais ações práticas são necessárias?
No caso das Defesas Civis municipais, tem de subir para o gabinete do prefeito. E coordenador de Defesa Civil não pode ser só cargo comissionado, precisa ter profissionais de carreira, aumentar o quadro. Também precisa investir em equipamentos. O papel da Defesa Civil é de coordenação, não de operação. Além disso, em desastres, não se cria plano, se executa. E para tomar decisões, é preciso ter dados, com análise sobre vulnerabilidade, demografia e perfil da população.
*Colaborou João Pedro Cecchini