
No final de maio, na assembleia de acionistas da Fraport em Frankfurt, a companhia alemã foi questionada por "socializar prejuízo" em Porto Alegre, cobrando recursos do governo brasileiro para reparar o aeroporto Salgado Filho. O protagonista foi o alemão Christian Russau, integrante desde 2010 da organização chamada Acionistas Críticos, criada ainda em 1986. Com a compra de apenas uma ação de grandes companhias alemãs, o grupo participa de assembleias e faz cobranças dos pontos de vista ético, social e ambiental a gestores e controladores. No caso da Fraport, sustenta que a "força maior" alegada para obter mais recursos públicos só vale se houver certeza de que não há motivos pelos quais a empresa deva ser responsabilizada - como negligência (deixou de fazer algo que deveria). Russau morou no Rio e em São Paulo e fala um bom português. Já esteve em Porto Alegre, acompanhando a remoção dos moradores da Vila Nazaré, decidida para permitir a ampliação da pista do Salgado Filho.
Como atua a Acionistas Críticos?
É uma associação sem fins lucrativos. A lei alemã permite que, comprando apenas uma ação, possamos participar das assembleias e fazer intervenções. Fazemos isso em todas as grandes empresas da Alemanha, como Volkswagen, Basf, Bayer. Na Alemanha, cada acionista tem direito de fala e voto. É muito mais fácil, basta uma assinatura, não precisa de advogado, como no Brasil.
É apenas uma ação mesmo, uma unidade?
Sim, uma só. Às vezes, outros acionistas nos pedem para representá-los, pessoas comuns que têm ações e querem que se faça algo positivo com isso. Ou querem garantir que haverá críticos nas assembleias de acionistas. Sempre somos minoria, nosso peso político e econômico é fraco, mas nem queremos ter mais poder econômico nas empresas. Não é o nosso foco.
Qual foi a atuação da Acionistas Críticos na Fraport?
Participamos da assembleia geral, no final de maio, e criticamos a empresa por estar querendo socializar prejuízos no Brasil. No passado, os lucros foram privatizados. É uma discrepância. Não podemos concordar com isso. Não temos votos suficientes para obrigar a empresa a agir de forma diferente.
Como avaliam a atuação da empresa em Porto Alegre?
Escandalosa. Nos alagamentos do ano passado em Frankfurt, quem arcou com os custos foi a Fraport.
Mas em Frankfurt a empresa é dona do aeroporto, não concessionária, como aqui, certo?
Sim, são donos. As responsabilidades dependem do contrato que fizeram, mas não acho correta a argumentação de força maior com a chuva. Essa é uma das empresas que contribuem fortemente para a mudança climática. Não podem agora querer ter dinheiro de reparação se faz parte da origem dos problemas. Na nossa visão, deveria assumir a corresponsabilidade.
Como os Acionistas Críticos veem a diferença entre o discurso e a prática de empresas em relação ao ESG (governança corporativa, social e ambiental)?
Temos a impressão de que usam essa linguagem só para limpar a imagem. Nós criticamos exatamente porque queremos que realmente as coisas certas sejam feitas.



