Não foi só no Palácio do Planalto que a manutenção do juro no patamar atual, de 10,5% ao ano caiu mal. A decisão também não agradou o setor produtivo, entre outros motivos porque a interrupção no ciclo de baixa deixa o Brasil em segundo lugar entre as maiores taxas reais do mundo.
Taxa real é calculada com base na taxa nominal, descontada a inflação, com dois métodos de cálculo: um considera a passada, outro a projetadas, sempre nos próximos 12 meses porque a Selic é anual.
A taxa básica, é bom lembrar, é referência para os custos de financiamento para a economia nacional, mas é o juro real que mais interessa a quem faz aplicações no mercado financeiro.
Por exemplo, quem aplica em um título atrelado à Selic trazendo recursos lá de fora sabe que não vai ganhar cerca de 10,5% líquidos, mas atualmente cerca de 6,79%, que é o juro real, porque desconta a inflação desse cálculo.
Quando começou o ciclo de baixa do juro no Brasil, em agosto de 2023, o mercado se inquietou com o risco de que México se tornasse mais atrativo, ou seja, ficasse com juro real maior.
Essa possibilidade direcionaria para outro emergente mais rentável os recursos que viriam para o Brasil - sempre falando em aplicações de mercado, não em investimento produtivo. No ritmo cauteloso do BC nacional, quase um ano e sete cortes depois, os mexicanos têm taxa real menor.
Neste momento, só a Rússia supera o Brasil em juro real, portanto em força de ímã para o dinheiro especulativo. O país já está premido por ampla variedade de embargos da União Europeia e dos Estados Unidos em reação ao ataque sem justificativa à Ucrânia.
Na semana passada, para reagir a medidas de Vladimir Putin que estavam atraindo capital nacional e estrangeiro à bolsa de Moscou, os Estados Unidos ampliaram as sanções ao mercado financeiro russo.
Os fatores de pressão no mercado
Falta de perspectiva do início de cortes de juro nos EUA: a taxa alta lá e mais baixa aqui diminui a atratividade de investimentos no mercado financeiro no Brasil, e investidores resgatam aplicações aqui para migrar para mercados mais lucrativos.
Ajuste fiscal: a decisão do governo Lula de reduzir o déficit primário (despesas maiores que receitas antes do pagamento da dívida) só com aumento de arrecadação, sem corte de gastos, é considerada frágil e difícil de manter ao longo dos quatro anos de mandato. A recente ajuda ao Rio Grande do Sul, que eleva os gastos, contribui com essa percepção. Sinalizações de cortes de gastos nos últimos dias chegaram a proporcionar algum alívio, mas não duradouro.
Eleições na Europa: embora fosse esperado o crescimento das bancadas que questionam a União Europeia, a expressiva votação da extrema direita na França fez o presidente Emmanuel Macron convocar eleições em seu país, o que eleva a incerteza na economia.