Em um mundo hiperconectado, empresas não são ilhas. Para acentuar a necessidade de assumir todas as responsabilidades dos negócios, o 24º Congresso do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) convidou ninguém menos do que R. Edward Freeman, criador da “teoria dos stakeholders”.
Parece palavrão, mas não é: estabelece que o compromisso das empresas não é apenas com sua própria sobrevivência e seus acionistas, mas com todos os públicos com os quais se relaciona — funcionários, fornecedores e a comunidade onde atua.
Parece óbvio, mas também não é bem assim. Ainda hoje, quase 40 anos depois da teoria de Freeman, há debate nos meios corporativos sobre se as empresas devem pensar só nos acionistas ou em todos os seus públicos. A palavra “stakeholders” faz jogo com “shareholders”, acionistas em inglês. Não é uma oposição, é uma ampliação de horizontes.
— Tenho uma boa notícia para vocês: mudanças nos negócios estão ocorrendo no mundo inteiro — abriu Freeman.
O filósofo e professor emérito da Universidade da Virgínia afirma que a definição “antiga” de que o foco dos negócios é apenas dinheiro e seu grande objetivo é apenas maximizar lucros está “completamente inadequada”.
— Vivemos décadas de tempestade perfeita. A crise financeira global provocou muita reestruturação que ainda tem consequências, temos problemas de racismo e discriminação de gênero, um real aquecimento global, a volta de guerras entre países e do terrorismo. Se não fosse o bastante, tivemos uma pandemia — acrescentou.
Freeman afirmou ainda que a combinação entre lucro e propósito — especificamente, o de tornar o mundo melhor — é a mudança necessária. Não um na frente do outro, ou um acima do outro:
— Temos de ser a geração que vai atuar melhor nos negócios melhores para deixar um mundo melhor para as crianças — destacou.
A abertura do congresso já reforçou a mensagem, com uma interpretação “bossa nova” do Hino Nacional feita por uma dupla de deficientes visuais, o pianista Luan Richards e a cantora Sara Bentes, depois apresentados pela mestre de cerimônias do evento, a empreendedora social cadeirante Caroline Ignarra. Sim, já é a teoria dos stakeholders posta em prática: inclusão também é responsabilidade das empresas.
A presidente do conselho do IBGC, Gabriela Baumgart, abriu o congresso com outros exemplos de compromisso com a coletividade: mencionou a volta do Brasil ao mapa da fome e o fato de a Amazônia ter emitido mais CO2 do que conseguiu capturar. Foi a forma de reafirmar que a boa governança corporativa só tem sentido com as melhores práticas sociais e ambientais.
*A jornalista viajou a São Paulo a convite do IBGC.
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