Matheus Fell e Luís Felipe Wallauer Ferreira se conheciam desde a sexta série do Ensino Fundamental quando o segundo propôs um negócio ao primeiro. Era 2015, e ambos tinham apenas 24 anos. Nascia, em Teutônia, o primeiro Quiero Café - marca que agora tem 48 unidades no Estado e se prepara para crescer no Sudeste.
— As pessoas que nos conhecem há pouco dizem 'nossa, como cresceram rápido', mas não sabem que é uma construção de oito anos — diz Matheus, do alto de seus atuais 32.
No ano passado, a rede faturou R$ 97 milhões, 78% em relação ao ano anterior. O plano é terminar 2023 com ao menos 60 unidades e faturamento próximo a R$ 145 milhões. Tudo começou com uma proposta feita por Felipe, que começava a trabalhar como advogado, ao amigo administrador de empresas que "gostava de fazer planos de negócio e planilha de custos".
A inspiração veio porque todos os dias ouvia queixas sobre a falta de um local para tomar um "café de trabalho" na cidade. Era para ser só isso, mas o amigo dos números diagnosticou logo: para parar em pé, era preciso oferecer mais. O foco foi em baixo custo: aluguel baixo e os dois sócios envolvidos na operação.
— Já fritei batata de terno e gravata - conta Felipe, explicando que era um dia de audiências no fórum e folga no café, mas voltou para ajudar porque o movimento estava grande.
Aliás, a aprovação dos clientes foi o que impulsionou um negócio destinado a ser paralelo a se desdobrar pelo Estado e fora do RS.
— Teutônia, como quase toda cidade do interior, tem lugares com produtos muito bons. O que faltava era um ambiente legal. Por isso, focamos na experiência, não no produto. Queríamos um lugar gostoso, aconchegante. Não tínhamos experiência em alimentação, mas quisemos oferecer uma saladinha, uma baguete. Tivemos de aprender no dia a dia — relata Matheus.
Deu tão certo, prossegue Felipe, que muita gente aparecia dizendo 'quero levar um Quiero para a minha cidade'. Claro, isso abriu o apetite por franquias, mas os sócios não quiseram dar o passo sem testar. Foi em 2017 que abriram a segunda unidade, em Lajeado, depois de contratar uma consultoria para formatar o modelo, elaborar manuais para padronização dos produtos e do serviço. E agiram como se os franqueados fossem eles.
— Lembro da sensação de quando assinamos 22 carteiras de trabalho no mesmo dia. Nunca tínhamos feito algo parecido. Já tínhamos colaboradores em Teutônia, mas eram oito ou 10 — confessa Matheus.
Atualmente, os dois mantêm seis cafeterias próprias - Teutônia, Lajeado (duas unidades), Chapecó (SP), Campinas (SP) e a do bairro Moinhos de Vento, em Porto Alegre. Até o final do ano, haverá 40 lojas no Rio Grande do Sul.
— Até porque aqui a gente já está em muitas cidades, o grande mercado potencial é o Sudeste, especialmente o interior de São Paulo — diz Matheus.
A coluna ficou intrigada sobre como uma proposta de cafeteria ter virado um restaurante com cardápio extenso criado por dois sócios sem experiências anteriores com a cozinha, e Felipe explicou:
— Uma das primeiras coisas que eu disse era que não queria fazer restaurante com cozinha complexa, exatamente porque a gente não sabia fazer. Mas quem manda no Quiero são os clientes. Um pedia um molho, outro uma carne, e a gente foi se sentindo obrigado a ir adaptando. Não queríamos um lugar de exceção, mas um local do dia a dia. Começamos com um cardápio de uma página, o segundo já tinha quatro ou cinco, e foi indo.
Para dar conta, explica, nem tudo é "feito em casa". Empresas parceiras fazem molhos, o feijão, os doces. E uma elaborada atividade de logística faz tudo chegar a todas as unidades uma ou duas vezes por semana. Até hoje, com exceção de um teste com um modelo menor, que foi descontinuada, nenhuma unidade fechou, nem durante a pandemia.
— Somos guris do Interior, tem um pouco de síndrome de vira-lata. Até por isso, mantemos a ideia de que sempre podemos melhorar. Nosso treinamento é focado na intenção de, a cada dia, errar menos. Temos total ciência de que não acertamos sempre. Começamos atendendo 20 pessoas por dia, hoje tem dias em que 15 mil passam nas nossas lojas. Não incentivamos o erro, claro, mas quando acontecer, a gente vai assumir, pedir desculpa e melhorar — observa Matheus.
Esses "guris do interior" já podem dar lição a muito marmanjo de cidade.
Leia mais na coluna de Marta Sfredo