Vilma da Conceição Pinto é diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI). Economista graduada pela UERJ e tem mestrado em Economia Empresarial e Finanças pela EPGE-FGV, atuou como assessora econômica na Secretaria da Fazenda do Paraná e é pesquisadora licenciada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV). Nessa conversa, a coluna aproveitou para perguntar porque a IFI é, ao mesmo tempo, independente e ligada ao Senado. Vilma detalhou que a independência do órgão é técnica. Na prática, significa que os diretores têm mandato fixo - não pode ser demitidos discricionariamente - e as publicações são submetidas apenas à aprovação do conselho diretor. O assunto principal, claro, é o marco fiscal que deve ser apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima quarta-feira (15).
O que já se sabe sobre o novo arcabouço?
Não chegamos a dialogar sobre os detalhes das regras fiscais. Mas entendemos que deve seguir alguns princípios, até porque a emenda constitucional que estabelece a prerrogativa do Executivo de encaminhar o modelo menciona que deve ser um "regramento fiscal sustentável". A regra tem de ser simples, flexível e fácil de aplicar. Nem sempre se consegue combinar essas três características de forma plena, mas é preciso arranjá-las da melhor forma possível. Com a incerteza atual sobre as contas públicas, é o marco que vai dar um horizonte de sustentabilidade e vai poder trazer um norte quando tivermos conhecimento da nova regra.
Nesse caso, o que seria flexibilidade?
Esse tipo de regra normalmente deve ter cláusulas de escape, para responder, por exemplo, ao que ocorreu na pandemia. Houve necessidade de efetuar mais gastos. Essa flexibilidade precisa ser bem desenhada para evitar que a regra perca credibilidade, como o teto, que teve alterações recentes. São mecanismos de salvaguarda. E é importante ser bem definida para que, passada a necessidade de urgência, seja possível retornar ao padrão de contas públicas equilibradas.
O problema do teto é que já na origem já provocou incerteza sobre seu cumprimento no horizonte a que se propunha.
Também pode reduzir os problemas que afetaram a prestação de serviços públicos, como ocorreu no passado com universidades e a Polícia Federal?
Esses mecanismos de bloqueio e contingenciamento estão mais associados à programação orçamentária e financeira do governo. A cada bimestre, o governo tem de avaliar suas contas, porque há flutuações nas despesas e também nas receitas. O problema do teto é que já na origem já provocou incerteza sobre seu cumprimento no horizonte a que se propunha.
O teto era de fato muito rígido?
Não necessariamente. Mas na pandemia houve demanda social maior, e trouxe luz a essas questões. Mas há havia essa eventual incompatibilidade. Em 2016, quando se discutia a PEC (proposta de emenda constitucional) que criou o teto de gastos, já se antevia que, para conseguir cumprir por 10 ou 20 anos, com a alteração do indexador, fazer mudanças na estrutura de gastos. Não bastava criar um teto. Para que fosse atingido, o ajuste estava condicionado a reformas. E a que teve foi a da previdência. Houve alguns ajustes que contribuíram para a redução de despesas, como o reajuste do salário mínimo só pela inflação, a suspensão de concursos públicos, o não reajuste dos servidores. Mas a regra foi pensada para que houvesse reformas para reduzir a relação entre despesas e PIB.
Foram medidas de ajuste de curto prazo. No médio prazo, esse ajuste terá de ser feito via reformas.
O que é realista esperar do marco fiscal?
Quando se fala em sustentabilidade das contas públicas, o ajuste pode se dar via movimento de despesas ou de receita. O governo já anunciou um pacote de ajuste fiscal que tem essa combinação. Não é um ajuste estrutural, que tende a andar de forma mais lenta, mas dá melhor expectativa comparado à lei orçamentária anual aprovada no Congresso. Foram medidas de ajuste de curto prazo. No médio prazo, esse ajuste terá de ser feito via reformas.
A relação dívida/PIB do Brasil só vai parar de crescer no médio prazo?
Vai depender muito do desenho da regra. Se o governo conseguir aprovar aprovara reforma tributária, por exemplo, ajuda bastante. Não vai ter efeito neste ano, porque depois de aprovar a emenda constitucional é preciso fazer legislação complementar. Mas depois da aprovação pode gera efeito nas expectativas.
Mesmo que o compromisso seja fazer uma reforma com efeito neutro sobre a carga tributária?
Sim, porque há expectativa de maior crescimento do PIB com a reforma. Nesse caso, aumentaria o denominador da equação (o indicador é resultado da divisão da dívida pelo PIB e, com um divisor maior, o resultado fica menor), ajudando a reduzir a relação dívida em relação ao PIB.