Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva só tem a perder com os ataques ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, encontrou um aliado improvável na sua crítica às metas de inflação apertadas.
É nada menos do que o responsável por implantar o sistema de meta de inflação no BC, o ex-diretor da instituição Sérgio Werlang, que considera as metas de 3,25% em 2023 e 3% em 2024 e 2025 baixas demais.
Obviamente - mas não custa enfatizar -, não é uma opinião de um "convertido" ao atual governo. Werlang fez essa advertência em agosto de 2021, quando a meta foi definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) - na época formado apenas por Paulo Guedes e Roberto Campos Neto (clique aqui para ver a manifestação). Disse que era "muito apertada" e "vai dar muito trabalho" para o BC:
— Será preciso mudar objetivo ou aceitar inflação acima dele.
Foi o que ocorreu em 2021 e 2022, dois anos sucessivos em que a inflação estourou o teto da meta. Só não ocorreu o mesmo em 2020 porque o teto era bem mais alto, de 5,25%. Ouvido em janeiro pela CNN, Werlang - que hoje atua como assessor da presidência da Fundação Getulio Vargas (FGV) detalhou as consequências da "meta muito apertada":
— Isso significa que os nossos juros são forçados a ficar mais altos do que poderiam para dar conta da tarefa, e o nosso crescimento, portanto, mais baixo. A meta no Brasil tem de ser um pouco mais alta do que a de países parecidos (…), porque a nossa política fiscal é muito rígida. É muito difícil fazer ajustes fiscais.
Os países parecidos seriam Chile e México, que têm meta de inflação de 3%. Werlang pondera que 3% representa um espaço muito pequeno para um índice de preços como o brasileiro, que tem peso muito grande dos alimentos e, por isso, oscila mais que os outros.
— É uma das razões básicas para a nossa inflação furar tanto o teto.
O aspecto técnico da discussão da meta seria beneficiado sem o debate político puxado por Lula. Tanto que o economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato, também pondera que é um tema que pode ser debatido, desde que bem embasado:
— A discussão tem de ser feita sem paixão. Não tem nada de errado nisso. É um debate que envolve uma discussão técnica e uma escolha política. É isso (a escolha política) que me deixa um pouco incomodado.
Nem FGV nem Bradesco são heterodoxos ou adeptos da "nova política econômica".