Tinha tudo para ser uma "ganhada" sobre o oponente, que sonhava em estar na capa da revista americana Time. Mas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez declarações comprometedoras na entrevista sonhada por qualquer candidato à Presidência da República.
Como se fosse Jair Bolsonaro, disse que "a gente não discute política econômica antes de ganhar as eleições". Como assim, candidato? Se não se discute na campanha, o povo brasileiro vai passar cheque em branco?
Parecia uma frase tão fora do figurino que a coluna foi checar no site em português da própria Time. Aí, se houver algum problema de tradução é da revista. A entrevistadora, Ciara Nugent, pergunta: "Muitas pessoas no Brasil dizem que houve muitas encarnações do Lula, especificamente em política econômica. Qual Lula temos hoje?"
E o ex-presidente responde:
"Eu sou o único candidato com quem as pessoas não deveriam ter essa preocupação, porque eu já fui presidente duas vezes. E a gente não discute política econômica antes de ganhar as eleições. Primeiro você precisa ganhar para depois saber com quem você vai compor e o que você vai fazer. Quem tiver dúvida sobre mim olhe o que aconteceu nesse país quando eu fui presidente da República: o crescimento do mercado. O Brasil tinha dois IPOs. No meu governo fizemos 250 IPOs. O Brasil devia 30 bilhões, o Brasil passou a ser credor do FMI, porque emprestamos 15 bilhões. O Brasil não tinha um dólar de reserva internacional, o Brasil tem hoje 370 bilhões de dólares de reserva internacional. […] Então as pessoas precisam ter em conta o seguinte: ao invés de perguntar o que é que eu vou fazer, olhe o que eu fiz."
Na eleição de 2018, Bolsonaro fugiu dos debates. Não respondia perguntas sobre economia porque deveriam ser dirigidas a seu "Posto Ipiranga", Paulo Guedes. Só o nome de Guedes era uma bandeira de liberalismo, privatizações, ajuste fiscal. Quase nada disso foi entregue. Dizer que não se discute política econômica em eleição é flertar com estelionato eleitoral, da mesma forma que fez a suposta antítese de Lula.
"Primeiro precisa ganhar para depois saber com quem você vai compor" ecoa o pragmatismo bolsonarista, que na eleição cantava "se gritar pega Centrão, não fica um meu irmão" e agora está alinhado com Arthur Lira (PP-AL) e considera intocável o orçamento secreto. Lula tem currículo — e dirão seus opositores, retrospecto judicial. Poderia tê-lo lembrado sem ofender a inteligência dos eleitores. Ao menos, dos que ainda têm algum discernimento.