Foi preciso verificar umas cinco vezes para ter certeza de que o resultado de setembro do Índice de Geral de Preços - 10, da Fundação Getulio Vargas, apontava queda de 0,37%. Ou seja, tecnicamente, seria uma deflação. Mas no Brasil, em setembro de 2021, quando se fala em estagflação?
— É uma enganação — foi a resposta supersincera de Matheus Peçanha, pesquisador do FGV Ibre que integra a equipe responsável pelo cálculo.
Falando sério, Peçanha explica que a "queda" se deve a apenas um produto, o minério de ferro, que despencou 22,17% no mês. É bom lembrar (veja detalhes abaixo) que o IGP-10 tem exatamente a mesma fórmula de cálculo do "primo" mais conhecido, o IPG-M, só muda a data de coleta de preços. O "10" do nome se refere ao fato de a pesquisa ser realizada até o dia 10 de cada mês. É por isso que, apesar de o mês ainda não ter terminado, já existir um indicador de inflação de setembro.
— É o índice que está enganando a gente. Se o minério de ferro for retirado do cálculo, em vez de cair 0,76%, o IPA (Índice de Preços no Atacado, que tem peso de 60% nos IGPs) subiria 2,05% — esclarece Peçanha, que se deu ao trabalho de fazer a conta para explicar a "enganação".
Por colher preços no atacado, a série dos IGPs é uma espécie de precursora do índice oficial de inflação, o IPCA. No ano passado, foram os IGPs que detectaram o início da pressão de custos que fez os brasileiros voltarem a conviver com o dragão inflacionário, que devora renda.
— A partir do próximo mês, esse efeito deve se dissipar e voltaremos a ver de novo o espalhamento da inflação. Quando se olha o consolidado, parece um alívio, mas no microdado a gente vê que o número está enganando — adverte o economista.
Peçanha reforça que, infelizmente, o resultado do IGP-10 de setembro ainda não é tendência. Mas é importante reforçar que, apesar da "enganação" no mês, o aumento do minério de ferro pressionou o aço lá em setembro de 2020, que por sua vez tornou mais caros automóveis, eletrodomésticos e computadores, entre outros equipamentos. Ao desinflar, portanto, projeta espaço para que esses preços voltem a murchar.
Os principais índices de inflação
IGPs: Índices Gerais de Preços, calculados pela Fundação Getulio Vargas. Têm três variações, IGP-M, IGP-DI e IGP-10, com diferença apenas no período de apuração. Cada um é composto por três subíndices: Índice de Preços no Atacado (IPA), com peso de 60%, Índice de Preços ao Consumidor (IPC), com peso de 30%, e Índice Nacional do Custo da Construção (INCC), com peso de 10%.
IPCA: Índice de Preços ao Consumidor Ampliado, calculado pelo IBGE, é considerado o índice oficial do Brasil porque serve de referência para o Banco Central. Mede a variação de preços de produtos e serviços consumidos por famílias com renda entre um e 40 salários mínimos.
INPC: Índice Nacional de Preços ao Consumidor, também do IBGE, mede avariação nos preços de produtos e serviços consumidos por famílias com renda entre um e oito salários mínimos. É a referência para negociações de reajustes salariais.
IPCs: Índices de Preços ao Consumidor calculados pela FGV, tem quatro variações, entre as quais a mais conhecida é o IPC-S.