A metade mais pobre da população brasileira foi a que mais perdeu renda durante a pandemia. É o que mostra o estudo Desigualdade, Pobreza e Estagflação, elaborado pela FGV Social.
A queda na média nacional de renda foi de 9,4% em relação a dezembro de 2019, incluindo quem tem emprego formal, inativos e desempregados. No Estado, foi pouco maior, 9,5%. Entre os 50% mais pobres, a perda se aprofunda para 21,5%.
Entre os 10% mais ricos do país, a perda foi de 7,16%, menos de um terço em relação à metade mais pobre. No grupo do meio (quem está entre os 50% mais pobres e os 10% mais ricos) a queda foi de 8,96%.
O desemprego acentuado pela pandemia é apontado como a principal causa da perda de renda. Entre os mais pobres, 11,5% da diminuição de renda foi ocasionada pela falta de renda do trabalho. Além disso, muitas pessoas que estão na base da distribuição de renda saíram do mercado de trabalho sem perspectiva de encontrar uma ocupação, o chamado efeito desalento.
Segundo o diretor do FGV Social e autor do estudo, Marcelo Neri, para atenuar o cenário é necessário investir em políticas públicas que visem transferência de renda, como o auxílio emergencial, que resultou em diminuição — mesmo que temporária — da pobreza no país.
— Com a criação do auxílio, a taxa de pobreza estava mais baixa. Após a reformulação do programa no início deste ano, o índice foi para 13%. Com a sua extinção passou para 16,1% (34,3 milhões de pessoas). Existe uma grande incerteza sobre o que vai acontecer com o Auxílio Brasil (que substituiria o Bolsa Família), mas é necessário criar uma política mais ampla do que o Bolsa Família, caso contrário pobreza seguirá crescendo — afirma.
Neri considera que o cenário de estagflação, que combina baixo crescimento, portanto baixo emprego, com alta inflação, tende a agravar a pobreza. Nesta quinta-feira (9), o IBGE anunciou aumento de 0,87% na inflação medida Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em agosto. É a maior inflação para o mês desde os anos 2000. Em agosto do ano passado, a variação foi de 0,24%.
Em 12 meses — entre julho de 2020 e o mesmo mês deste ano —, a inflação entre os pobres foi de 10,05%, três pontos percentuais acima da inflação da alta renda, segundo o Ipea. Durante a pandemia, a taxa de desemprego subiu de 26,55% para 35,98%, entre os mais pobres. Entre os 10% mais ricos o aumento foi de 2,6% para 2,87%.
Quem perdeu mais
Alguns grupos foram especialmente mais afetados pelo cenário. No Nordeste, a perda de renda chegou a 11,4%, ante a média nacional de 9,4%. Para as mulheres, a entrada de recursos diminuiu 10,35%, ante 8,4% para os homens. Por fim, entre a população com mais de 60%, a perda foi de 14,2%.
Para as mulheres, a dupla jornada (trabalho e atividades domésticas) pode ser apontada como um fator agravante. Entre os idosos, a saída do mercado de trabalho por conta dos riscos de contaminação pela covid-19 é um dos fatores responsáveis pela perda.
Na avaliação de Marcelo Neri, para diminuir o efeito entre grupos específicos é necessário aplicar políticas públicas mais direcionadas. O economista cita o avanço da vacinação
como uma medida que viabiliza, por exemplo, o retorno dos idosos às suas atividades profissionais.
* Colaborou Camila Silva