O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
O novo adiamento do Censo Demográfico, devido a restrições orçamentárias, coloca o Brasil sob risco de apagão na área estatística. Mais do que isso: põe em xeque a eficiência de políticas públicas e investimentos da iniciativa privada.
É que o Censo traça um perfil detalhado dos brasileiros, com dados sobre diferentes regiões e condições de vida da população. Ou seja, o levantamento serve para balizar decisões com grande impacto social.
A pesquisa é realizada a cada 10 anos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Censo estava previsto inicialmente para 2020, mas, em razão da pandemia, foi adiado para 2021.
O que inviabilizou novamente o trabalho foi o corte no orçamento da União, sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro na semana passada. O governo confirmou a suspensão do levantamento na sexta-feira (23).
Ex-presidente do IBGE, Roberto Olinto lamenta a decisão. Segundo ele, o quadro ameaça inclusive a pesquisa em 2022.
Para realizá-la no próximo ano, já seriam necessárias a compra de equipamentos e a preparação da equipe envolvida com o projeto, assinala Olinto. Assim, o Censo que ocorreria em 2020 seria empurrado para 2023.
— É um problema sério. Ao cortar o orçamento deste ano, o governo está inviabilizando o Censo em 2022, porque não há dinheiro suficiente. Criou-se uma dúvida se realmente existe interesse em fazer a pesquisa — aponta Olinto, que comandou o IBGE de 2017 a 2019 e hoje é pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
Inicialmente, R$ 2 bilhões estavam previstos para o Censo. Do total, apenas R$ 71 milhões foram mantidos no orçamento aprovado pelo Congresso em março. O texto sancionado por Bolsonaro na semana passada reduziu ainda mais a verba, para cerca de R$ 53 milhões.
Olinto reforça que o impasse afeta a rotina do cidadão. Por exemplo: a contagem da população é usada como referência para repasses do governo federal a municípios.
Com a defasagem nos dados, o empresariado também pode ser prejudicado antes de fazer investimentos. Nesse caso, a ausência de estatísticas atualizadas sobre o mercado consumidor dificulta as projeções de demanda por bens e serviços em cada localidade.
No governo gaúcho, também há preocupação com o vácuo estatístico. "Para quem está no poder público, e mesmo na iniciativa privada, a falta de fatos e dados precisos sobre a realidade tem um impacto profundo nos planos de ação e nas expectativas de resultados. É como tratar um paciente sem conhecer ou saber a causa da doença", escreveu nas redes sociais o secretário estadual de Planejamento, Governança e Gestão, Claudio Gastal.