O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
Leilões promovidos na última semana pelo governo federal despertaram o interesse privado na área de infraestrutura. O pacote de ativos concedidos inclui 22 aeroportos, três deles no Estado (Bagé, Pelotas e Uruguaiana). Para analisar o cenário de concessões e privatizações no país, a coluna conversou com Ricardo Jacomassi. A seguir, veja os principais trechos da entrevista com o sócio e economista-chefe da consultoria TCP Partners.
Qual é a mensagem deixada pela sequência de leilões da última semana?
A principal mensagem é que o Brasil tem atrativos em termos de retorno de médio e longo prazos. Os ativos leiloados carecem de investimentos, melhorias e expansão. Precisamos ser competitivos na área de logística. Quando a economia voltar, terá demanda crescente, e os aeroportos leiloados serão atraentes.
Apesar de os leilões terem atraído investidores, o Brasil segue em momento de turbulência política e é abalado pela pandemia. Qual é o cenário para novos projetos em infraestrutura?
O que a gente espera é que o investidor estrangeiro também tenha apetite para novos projetos. Mesmo com toda a situação na área política e a pandemia, temos horizonte importante de ativos que carecem de investimentos.
Qual é o ponto relevante? É a incerteza sobre até que nível o governo vai estar empenhado em fazer uma abertura maior da economia. Há estatais que precisam ser vendidas. Posso elencar uma, o Banco do Brasil. Ou a própria Petrobras.
Temos bons ativos que, se forem levados a privatizações, serão atrativos. É preciso acelerar o processo de redução do Estado em alguns setores da economia. Temos de privatizar.
Você citou a Petrobras. Seria a venda total da companhia? Ou a privatização de alguns ativos? A estatal já busca negociar refinarias, por exemplo.
A venda total é improvável no curto e no médio prazos. Não posso vender sonhos. Mas a desmobilização de investimentos feitos nos últimos 10 ou 15 anos vai ocorrer. É favorável, porque estamos passando por momento de mudanças de matriz energética. A Petrobras não pode ficar longe disso. Há alguns ativos em que não faz sentido continuar investindo, como distribuição e logística. O DNA da Petrobras não é esse.
Como descreve o cenário para a economia como um todo?
No início do ano, boa parte do mercado projetava um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) acima de 3,5% em 2021. Estávamos um pouco mais conservadores. Nosso número (da TCP) era de 2,8%. A gente mantém essa perspectiva. Com a onda muito mais forte da pandemia, vários segmentos importantes voltaram a fechar atividades, principalmente serviços. Comércio e serviços representam, mais ou menos, 70% da economia nacional. São muito relevantes.
Deveríamos ter trabalhado com a curva de aprendizagem que tivemos ao longo de 2020, mas não fizemos isso. Houve demora na vacina e tudo que a gente viu entre fevereiro e março. Isso compromete a economia. Antes, não tínhamos uma inflação como a de hoje. É um cenário de preços comprometedores para a atividade. O Banco Central teve de aumentar a taxa de juro, e vai continuar nessa trajetória.
Também estamos preocupados com o lado fiscal. O principal ponto que vai levar a um crescimento ou a uma retração mais forte da economia é o lado fiscal. O orçamento que foi encaminhado é um orçamento surreal. Tem vários itens comprometedores. O tamanho dos gastos que estão ali preocupa.
Estamos alertando, a dívida está caminhando para 100% do PIB. Se chegar a 100%, comprometerá a recuperação tanto no curto prazo quanto no médio e no longo. Vai ter aumento da taxa de juro em velocidade mais acelerada, uma inflação em patamar que vai comprometer a renda das pessoas. Assim, a recuperação do emprego se torna mais morosa, demorada.