O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
Por que a Ford resolveu encerrar a produção de veículos no Brasil e manter as operações na Argentina e no Uruguai? Essa foi uma das tantas perguntas que surgiram após a montadora comunicar, na segunda-feira (11), o fechamento de três fábricas verde-amarelas.
Por trás da decisão, há uma combinação de fatores. Em linhas gerais, o fato é que, nos últimos anos, a Ford vinha perdendo espaço no mercado brasileiro. Além disso, há características das fábricas na Argentina e no Uruguai que tendem a tornar as operações mais atrativas por lá, apontam analistas do setor automobilístico.
O economista Raphael Galante, da Oikonomia Consultoria Automotiva, lembra que, na Argentina, a montadora investe na produção de carros maiores, como picapes e SUVs. Ou seja, ao deixar a produção brasileira, a Ford pretende apostar em modelos de maior valor agregado daqui para frente.
— As operações na Argentina se especializaram em picapes e SUVs. São carros de alto valor agregado — diz Galante.
Em comunicado, a Ford ilustrou essa escolha. A multinacional afirma que continuará com um "portfólio empolgante, conectado e cada vez mais eletrificado de SUVs, picapes e veículos comerciais, provenientes da Argentina, Uruguai e outros mercados".
Na visão de Galante, a manutenção das operações uruguaias pode estar relacionada a ganhos de logística. Ou seja, poderia ficar mais fácil e barato para a companhia exportar a partir de um país menor. No Brasil, além de fábricas espalhadas por um extenso território, também há complexidades na área tributária, frisa o economista.
Na segunda-feira, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que a decisão da Ford é "alerta para a redução urgente do Custo Brasil". Ao tratar do episódio, a entidade voltou a defender a aprovação da reforma tributária.
— A decisão não foi tomada porque o executivo da Ford dormiu mal no final de semana e resolveu fechar as fábricas. É uma medida que vem sendo maturada. Não adianta produzir e vender no mercado brasileiro, mas continuar com prejuízo. A companhia precisa encontrar um equilíbrio — pontua o gerente de desenvolvimento de negócios da consultoria Jato Dynamics, Milad Kalume Neto, que lamenta a perda de empregos no país.
Números da Fenabrave, que representa as concessionárias, ilustram a perda de espaço da Ford no Brasil. Em 2020, a montadora respondeu por 7,14% das vendas de automóveis de passeio e comerciais leves. Com isso, ficou no quinto lugar do ranking nacional. Em 2015, a companhia era a quarta da lista, com 10,24% do mercado. Em 2010, essa fatia era de 10,10% (veja gráfico).
Ao comunicar o fim da produção brasileira, a Ford também citou perdas geradas pela pandemia. Galante vai além. Segundo ele, a companhia vinha em dificuldades para renovar o portfólio de produtos nos últimos anos, o que exigiria grande volume de investimentos. Com o mercado em marcha a ré e repleto de complexidades, a decisão foi pelo fechamento das fábricas.