Não parece haver argumento racional, econômico, ou pragmático que convença o governo Bolsonaro. Uma semana depois do discurso na abertura da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), quando o presidente evitou incinerar a "marca Brasil", recitando frases em que reconhecia a importância dos ativos ambientais, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, joga gasolina na imagem chamuscada do país.
Enquanto o Brasil é questionado por seu manejo ambiental, Salles decide, com apoio de um conselho esvaziado, extinguir duas resoluções que delimitavam as áreas de proteção permanente (APPs) de manguezais e de restingas do litoral brasileiro.
O senso de oportunidade de Salles, que chega a ser chamado de "antiministro" ou de "ministro do ambiente zero", deveria ser objeto de estudo –para ser evitado. Na semana passada, o Banco Central informou a situação do investimento externo direto no Brasil: queda de 85% em agosto.
Esse tipo de entrada de dólares no país não é de capital especulativo, é a que resulta em capacidade produtiva e projetos de longo prazo. Entre os motivos do tombo, estão a pandemia, a desconfiança com a situação fiscal do país e, de forma muito acentuada, o temor de investir em um pária climático global.
Se a intenção do ministro que queria "passar a boiada" foi provocar uma fuga adicional de aportes, provavelmente será bem-sucedido. No discurso da ONU, Bolsonaro tentou não adicionar desastre à tragédia da Amazônia e do Pantanal. Não teve grande êxito, mas ao menos esboçou uma reação. Se havia sobrado um pingo de água para aplacar a fogueira da "marca Brasil", foi consumido pela decisão de Salles.
O "antiministro" é tão contraproducente que já gerou pressões por sua demissão não por ambientalistas, mas por representantes do agronegócio. Grandes empresas do setor já buscam alternativas fora do governo para reduzir os danos à imagem do Brasil. E se ainda assim continua no cargo, não há dúvida: está fazendo o que foi chamado para fazer.