Primeiro foram fundos globais que administram o equivalente a quase R$ 20 trilhões em recursos, depois CEOs de grandes empresas privadas brasileiras, e agora é a vez dos três maiores bancos privados do país — Itaú Unibanco, Bradesco e Santander. Todos cobram o mesmo do governo Bolsonaro: um compromisso inequívoco com a preservação da Amazônia.
Como a coluna repete à exaustão há mais de um ano, compromisso ambiental se tornou uma exigência no exercício do capitalismo no século 21. Está muito longe de ser elemento de "marxismo cultural", como descreve a ótica míope da ala mais ideológica do governo.
Como a tentativa do governo Bolsonaro de estancar a deterioração da imagem do Brasil no Exterior, causada pelas queimadas na floresta e acentuada pela gestão da pandemia de coronavírus, não avançou para ações e metas, os bancões resolveram ir além da cobrança. Se faltava um plano, vão apresentá-lo.
Estão dispostos a formar um conselho de especialistas e a implantar uma dezena de medidas que passam por estímulo a cadeias produtivas sustentáveis e investimentos em infraestrutura básica na região. Além de plano e meta, têm cronograma, que prevê a implementação de medidas ainda neste ano.
No discurso dos comandantes dos bancos, não há críticas ao governo Bolsonaro. Apenas declarações de "contribuir para um mundo melhor" (Bradesco), preocupação com "o desenvolvimento socioeconômico da Amazônia e da conservação ambiental" (Itaú) e necessidade de "atuação firme e veloz a todos os atores que puderem participar da construção de um modelo de desenvolvimento sustentável para a Amazônia" (Santander).
Mas a exasperação com a falta de compromisso e de iniciativas do governo fica clara não só nas notas oficiais dos líderes de cada instituição financeira, como na própria iniciativa. Ainda que feita com palavras cautelosas, é uma intervenção da iniciativa privada na administração pública, diante da inação ou inapetência do governo Bolsonaro. Dá sinal de que o Brasil precisou terceirizar a gestão da crise amazônica.
No setor privado mais esclarecido, ficou claro que a incúria ambiental não ameaça apenas o maior acordo comercial já fechado pelo pais, entre Mercosul e União Europeia. Marcas nacionais perderam valor diante de consumidores estrangeiros. Executivos brasileiros são confrontados por pares globais em fóruns internacionais.
Com o endividamento crescente e necessário do governo provocado pelas despesas com a pandemia, o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos von Doellinger, afirmou à coluna que será preciso contar com investimento privado para a retomada da economia.
Boa parte desses recursos terá de vir do Exterior, inclusive de fundos como os que acenderam o sinal amarelo para o Brasil. Mais do que a preservação da Amazônia, já se trata do resgate do país. Se não há disposição ou competência no governo Bolsonaro para fazer a gestão da crise, a terceirização se impõe.